É o lugar, estúpido
Mais de uma década atrás, as Lojas Americanas adquiriram a Blockbuster no Brasil. Estavam interessadas no já decadente mercado de locação de DVDs? Claro que não. Queriam os bem localizados pontos de venda da rede norte-americana, que, ao longo do tempo, tratariam de substituir por seus próprios estabelecimentos.
Em meados de fevereiro, movimento estratégico semelhante foi feito pelo Carrefour, que comprou 30 lojas da rede de atacados Makro (foto) fora do estado de São Paulo a fim de transformá-los em estabelecimentos da sua própria rede, o Atacadão. As unidades do Makro são deficitárias, lembrou uma repórter, ao que respondeu o CEO da cadeia francesa: "Não importa o resultado (...). [I]mportante para nós é a localização" (leia aqui e aqui).
Imediatamente, lembrei do livro "Todos os negócios são locais", dos professores John Quelch e Katherine Jocz (Portfolio Penguin, 2014). A obra pode ser vista como mais uma exaltação da importância do P de praça no mix de marketing, às voltas com uma suposta ameaça do digital e do e-commerce, do que como um trabalho técnico. Mas contém insights interessantes.
Segundo Quelch e Jocz, um canal de distribuição físico não apresenta apenas uma dimensão real, concreta, como também psicológica – "as pessoas possuem uma rede de associações mentais de localidades" que "são transferidas para preferências de produtos". Por isso, priorizar somente a presença digital seria um erro. "[T]endências concorrentes (o físico e o digital) estão empurrando empresas multinacionais em todas as direções ao mesmo tempo". No Brasil, a Magazine Luiza talvez seja o melhor exemplo dessa realidade, acredito.
Mas o que mais se aplica ao caso do Carrefour-Makro é a lembrança de que "menos de 1% das vendas ocorre on-line". Ora, é possível apostar que revendedores de micro e pequeno porte, clientela majoritária de Makro e Atacadão, enquadrem-se nos 99% – e prefiram abastecer seus negócios em pontos onde possam escolher as mercadorias presencialmente. "O lugar virtual ganhou predominância sobre o lugar físico em um número muito pequeno de categorias de bens e serviços quando se trata do processo de venda", reitera o livro.
Daí que a resposta do CEO do Carrefour pareça mais do que lógica – e sim óbvia, na verdade. No negócio da rede francesa, a localização dos pontos de venda confunde-se com a estratégia da organização. Ou, para voltar aos autores, "[a] estratégia de distribuição deve andar de mãos dadas com a estratégia de marketing".
Ah, sim. Quelch e Jocz lembram que"[d]istribuição pode não ser a parte mais glamorosa do marketing, mas é essencial".
Atacadistas que o digam.
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