Santo Antônio: um tempo bem passado

Um dia comum na cozinha do Santo Antônio começa bem antes do horário do almoço. Antes de os clientes chegarem, ocorre o “mise en place”, termo em francês que precisa ser praticado por qualquer chef: é o preparo de todos os ingredientes que serão usad...

Um dia comum na cozinha do Santo Antônio começa bem antes do horário do almoço. Antes de os clientes chegarem, ocorre o “mise en place”, termo em francês que precisa ser praticado por qualquer chef: é o preparo de todos os ingredientes que serão usados nas montagens dos pratos. A peça do filé é limpa e cortada em porções de 400g. Cada parte vai servir um prato. As diferentes saladas são lavadas e separadas em potes plásticos. Os molhos são preparados e mantidos aquecidos em potes de metal, colocados em banho-maria junto à chapa. Os demais acompanhamentos (arroz, feijão e farofa) também são cozidos e mantidos aquecidos no fogão em banho-maria. Quando começam a chegar os pedidos, a cozinha vai trabalhar com seis pessoas: o chef (responsável pela equipe), o chapista (vai preparar os filés), a saladeira (vai montar as saladas), duas cozinheiras (vão montar os pratos e cuidar dos acompanhamentos) e uma auxiliar de cozinha (vai cuidar da limpeza dos pratos e utensílios). 

Embora o comando seja do chef, quem vai ditar o ritmo do trabalho é o chapista. É ele quem recebe o pedido vindo do salão, por meio de um sistema eletrônico (uma máquina parecida com as que fornecem extrato de banco) e repassa para a equipe o que deve ser preparado.

O momento mais importante do desempenho da cozinha fica na mão do chapista. É ele o responsável por associar o ponto do filé pedido pelo cliente (malpassado, ao ponto, bem passado) com o molho escolhido. Não é tarefa fácil: é comum cerca de 20 filés serem grelhados simultaneamente, todos na mesma chapa. Num domingo de muito movimento, duas chapas chegam a preparar 80 filés simultaneamente. Esse é o momento decisivo para a cozinha do Santo Antônio e o segredo de sua sobrevivência ao longo de 80 anos. A missão é preparar o filé e tratar cada pedido como único. Nunca dois filés serão iguais, pois atendem ao paladar de clientes diferentes. Se o ponto do filé não está certo, a carne é perdida, pois outra porção precisa ser grelhada. E a missão fica prejudicada. Um filé fica cerca de dez minutos na chapa para ficar ao ponto. A partir daí, é encaminhado pelo chapista num prato raso para as cozinheiras, que vão juntar os molhos e os demais acompanhamentos previstos no cardápio. Em poucos minutos, chega à mesa no ponto pedido, para delírio do comensal.

Terminada a refeição, é hora da sobremesa. E, como tudo no Santo Antônio, há tradição nos docinhos levados à mesa pelos garçons em simpáticas caixinhas de acrílico transparente, para delírio dos clientes. Quando os doces começaram a ser servidos, eram feitos por um fornecedor do Uruguai: pudim de laranja e de leite e papo de anjo foram as primeiras sobremesas. No início dos anos 70, Vania, filha de Caetano, assumiu a tarefa de preparar os doces. Começou com negrinhos, que rapidamente foram muito bem aceitos pela clientela. Mais tarde, aprendeu com um doceiro espanhol a fazer papo de anjo, quindim e doces caramelados, que foram incorporados ao cardápio e até hoje são preparados por Vania. Já os merengues são fornecidos por outra família há 40 anos. Começou com Zenaide Ferras, que passou a receita para a nora, Elza, e que passou a tradição para a filha Luciana, a atual fornecedora das guloseimas.

Três bodas celebradas no restaurante pediram pratos especiais. Ao completar 50 anos do Santo Antônio, Caetano lançou o Filé Cinquentenário, por sugestão da filha Elaine, grelhado e servido com molho de mostarda. Nos 70 anos, a novidade foi o Filé com Champignon.

Em maio de 2015, foi a vez do Filé 80 Anni passar a fazer parte das opções oferecidas ao cliente. A carne é grelhada com uma crosta de pimenta quebrada e servida coberta com um molho feito com passas de uvas cozidas no vinho Cabernet Sauvignon.

Nenhum deles, no entanto, supera o preferido do público: o Filé à Parmegiana. Ele é recheado com presunto, depois empanado na farinha de trigo, passado no ovo batido e coberto por uma camada de farinha de rosca. Por fim, é frito e finalizado com uma cobertura de queijo e molho vermelho. Serve uma família inteira.

E no Santo Antônio a família sempre tem razão. Há 80 anos.


Sobre o livro
Fundado por uma italiana no ano de 1935, até hoje o Restaurante Santo Antônio mantém as tradições sendo ponto de encontro para famílias que lotam suas mesas para saborear a comida farta e bem preparada. A publicação relata as origens de Conchetta Aita, a fundadora do Santo Antônio, e como a casa foi sendo administrada pelas gerações seguintes da família. A história foi escrita pelo jornalista Alexandre Bach, a partir do depoimento de funcionários, clientes e de Jorge e Elaine, que hoje comandam o restaurante junto com os filhos de Jorge, sobrinhos da quarta e integrantes da quinta gerações dos Aita. “Tempo bem passado” está disponível no Santo Antônio neste mês de dezembro para os clientes que forem jantar no acompanhados de três ou mais pessoas (um exemplar por mesa, enquanto durarem os estoques).

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