Queixa de vizinho
Você, leitor, certamente sabe o que é o narguilé. Também conhecido como "chicha", trata-se daquele cachimbo de água em que uma pedra de tabaco aromático é posta a arder e cuja fumaça o apreciador aspira pelo bocal de uma mangueira. Ao fazê-lo, a água borbulha, o que sempre alimentou a crendice de que as bolhas formadas contribuíam para purificar o fumo de seus danos, o que está longe de ser verdade. Comum no Egito e no Oriente Médio, o narguilé irrompeu com força na pequenina Kehl, primeira cidade alemã ao lado de Estrasburgo, França, e até aqui nada há de muito errado em frequentar o Zizou, o Velvet ou o Sahara, frequentados por moradores de ambos os lados da fronteira franco-germânica e, em especial, por imigrantes do Norte da África e do Oriente Médio, que se esbaldam com os aromas familiares.
O problema que as autoridades estão detectando, contudo, é que as "chichas" da cidadezinha alemã de 36 mil habitantes, colocam à disposição dos clientes quase 700 máquinas caça-níquel. Se em Amã ou no Cairo, o narguilé é contraponto para animadas partidas de gamão, em Kehl a realidade é outra. Pois como o jogo é proibido na França, e como na Alemanha todo bar pode ter uma máquina no recinto, são muitos os alsacianos que pegam o bonde e vão até a cidade renana para jogar. Ao se tornarem compulsivos, desequilibram sua vidas – muitas vezes já um pouco precárias –, o que vem causando problemas aos assistentes sociais. Sendo boa parte deles jovens de origem turca, é frequente que sejam as esposas a telefonar em busca de ajuda, muitas vezes para evitar suicídios.
Como uma coisa pode facilmente levar a outra, embora nada me autorize a fazer uma ilação a partir desses simples fatos, foi no bar em que escrevo estas linhas, perto da prefeitura, chamado Diva, que o terrorista Foued Mohamed Aggad preparou com comparsas o famigerado ataque à boate Bataclan, de Paris, o que tem levado alguns alemães a dizer que o regime de fronteira aberta e circulação de bonde entre ambos os países, poderia estar trazendo até Kehl os elementos indesejáveis de Estrasburgo. Claro está que os franceses dizem a mesma coisa, na medida que é do outro lado do Reno que a vida se organiza de forma distinta. Seja como for, comunidades vizinhas não diferem muito do regime que rege a vida de famílias que dividem o mesmo andar. Um dia trocam-se bolos. Em outros, apupos.
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