Como motivar Neymar no PSG

Sem delongas nem prolegômenos, eis um receituário heterodoxo:   1 - Disfarçado de peruca e adereços que o deixem incógnito, Neymar deveria percorrer o metrô como passageiro em horário de pique, de preferência fazendo os mesmos trajetos que cumpre a m...
Como motivar Neymar no PSG

Sem delongas nem prolegômenos, eis um receituário heterodoxo:  

1 - Disfarçado de peruca e adereços que o deixem incógnito, Neymar deveria percorrer o metrô como passageiro em horário de pique, de preferência fazendo os mesmos trajetos que cumpre a maioria dos torcedores de seu time. Deveria passar um começo de tarde modorrenta em Aulnay-sous-Bois, o desolado subúrbio ao norte, onde hordas de desocupados já atearam fogo em carros, sob pretexto de tudo e de nada. Ter o sentimento da periferia, longe de Neuilly e de suas casas engalanadas, lhe daria um senso de missão extra, o que se refletiria em campo com a bola nos pés; 

2 - Um rapaz como ele vai se sentir motivado a aprender francês se tiver um par de mestres a alternar as vozes. Afora o patoá dos vestiários, sugiro uma mulher e um homem com essa missão. Ela que seja jovem, linda, comprometida com o que faz, sorridente, e que lhe administre vocabulário a partir do que o psiquismo dele consagra: conquistar mulheres, de preferência as que não estejam à venda (ainda há). O professor, de meia-idade, dará um vocabulário que derive de histórias de superação e de dor – calcado em acidentes, panes aéreas, sequestros e lesões;

   

3 - Para não se sentir diminuído por estar à mercê de entendidos em tudo, que se lhe reforce a assertividade em terrenos onde ele não teve chance de se educar. Ora, a Espanha, França, Itália – os países onde deverá circular pelos próximos oito anos até o fim da carreira (sim, é o que falta) –, todos são lugares de vinho. Por que não aprender noções básicas de enologia com um "sommelier" que lhe mostre por a+b o que há de divino por trás daqueles "grands crus" que lhe sugerem, e de que ele não gosta. Por que não educá-lo para dar uma base de certezas num terreno mundano?; 

4 - O mesmo vale para a gastronomia. Lembro do jogador Viola que abortou uma temporada no Valência por ter achado a comida horrível, logo na Espanha onde se come tão bem. Paladar vem de berço. É muito difícil educá-lo mais tarde, sem que haja uma orientação por mãos competentes. Assim, deixando o rapaz à vontade com suas preferências, um orientador vai ajudá-lo a conhecer novas fronteiras gustativas, um passo fundamental para se tornar melhor cidadão e melhor amante, já que isso o preocupa tanto – legitimamente, aliás. Quem come mal, fatalmente é um amante meio desastrado, sem senso de "timing" – um elemento vital na cama; 

5 - Ainda disfarçado, que se leve o jogador para um sábado na Normandia. Que veja as praias onde desembarcaram os aliados. Num dia de folga, que tal ir a Berlim para que sinta tudo o que esteve em jogo na Guerra contra o Nazismo? Faça-se isso algumas vezes sem muita teoria e sem muitos fatos. Presta-se a dar régua e compasso aos contornos civilizacionais do espaço onde está inserido, e aos vetores determinantes da história recente. Dar concretude e tangibilidade ao que a História diz, é uma forma de enriquecer a percepção e diminuir o "gap" da ignorância vis-à-vis os rapazes que nasceram na Europa.

Em suma, não sei o que diria o mestre Paulo Freire, cujos desígnios pedagógicos são hoje tão estigmatizados por alguns. Mas meu método mal costurado de sensibilização intercultural para atletas muito ricos de bolso e meio vazios de coração e mente, seria este. É claro que pode-se agregar outros elementos. Mas um modesto artigo não pode resolver tudo. 

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Quinta, 02 Mai 2024

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