Os 60 anos de Hélio Masur

A categoria de gente que mais deploro é aquela que não tem amigos. Uma pessoa pode viver sem carrões, grandes espaços, viagens ou até livros. Mas se não tem amigos, perde-se um link fundamental com o sublime. Para quem ligar para dividir a notícia de...
Bolinhas

A categoria de gente que mais deploro é aquela que não tem amigos. Uma pessoa pode viver sem carrões, grandes espaços, viagens ou até livros. Mas se não tem amigos, perde-se um link fundamental com o sublime. Para quem ligar para dividir a notícia de um novo amor? Quem convocar no momento em que os calos apertam e a vida parece destituída de todo sentido? Embora convicto da verdade que tudo isso representa, nem sempre cultivei meus amigos como deveria. Muitas vezes me vali de desavenças pontuais para cortar os vínculos. É bem verdade que a ruptura era o que o caso recomendava algumas vezes. De outras tantas, porém, faltava paciência para cultivá-los como pediam, e eu posso ter me sentido embalado pela sensação de que a reposição seria fácil. 

Isso dito, me alegro em dizer que tenho muitos amigos e amigas.  Sim, amigas também. E olhe que isso não foi lá muito evidente no passado. Lá atrás, eu via as mulheres como namoradas em potencial e me pareciam carentes de elementos que forjassem uma proximidade que fosse descomprometida com o sexo. Mas isso foi há muito tempo. Desfrutar da amizade delas se provou tão bom e tão ou mais envolvente quanto dos amigos. É claro que ao apertarmos os critérios, chegaremos à conclusão de que nem todos nos são assim tão próximos. Eis um terreno em que a reciprocidade de expectativas conta imensamente. É difícil você se considerar um grande amigo de alguém que não o tem na mesma medida. Mais cedo ou mais tarde, o jogo se desequilibra e a casa cai.  

Eu tenho bons amigos. Nos últimos anos, perdi pelo menos dois dos mais queridos, ambos de infância. Nunca vou deixar de pensar neles pelo resto de meus dias. Outros passam por momentos críticos de vida familiar e profissional, e também penso neles toda vez que coloco a cabeça no travesseiro ou que desperto. Dos que estão vivos e vão bem, Hélio Masur, que completa nesta segunda-feira 60 anos, é aquela figura insubstituível em todos os momentos. Certa feita um marroquino me conceituou o que é ser amigo para um árabe: "Um amigo é aquele cara que jamais te diz não". Pois bem, Hélio se encaixa à perfeição nessa moldura tão radical. Sempre pronto para deixar de lado o que estiver fazendo para um dedo de prosa, passamos centenas de horas ao ano em animado bate-papo, apesar das distâncias físicas. 

Além da extrema confiança mútua, do privilegiado senso de humor que tem, admiro-lhe o desprendimento em se dedicar aos filhos, aos familiares e ao trabalho. Sempre com mil coisas para fazer, não faltará ânimo para comer uma buchada de bode com aguardente em pleno dia de semana, mesmo que tenha que pilotar as sucessivas mensagens de WhatsApp que aterrissam em três telefones. Com Hélio, os assuntos não têm hierarquia de prioridade. Vale desde a saúde aos negócios, das viagens aos dias de introspecção. Longe dele hoje, separado por milhares de quilômetros, mando daqui meu abraço a este irmão que faz da alegria de viver um credo e da amizade uma religião. Oxalá possamos estar juntos em breve para uma comemoração em devida forma. 

Sim, cultivem seus amigos. Eles são para os tempos bons e ruins, para o sol e a chuva. 

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Sexta, 13 Dezembro 2024

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