Como ficarão China e Brasil em 2025?
Perdoem-me os pessimistas, mas a realidade é que os fatos desse início de ano sinalizam cenário mundial muito difícil em 2025. O único país que deverá continuar em seu ritmo é a China, porque precisam, são hábeis negociadores e têm estratégia e planejamento. O Brasil, para variar, não tem um "Plano BR" – o que significa que iremos ao sabor dos acontecimentos, reagindo pontualmente às ações do novo presidente dos Estados Unidos (EUA), de impor tarifas abusivas em produtos importados, ou das empresas da China, de recusarem produtos importados, reduzirem as compras ou demorarem para pagar.
Produtos do Brasil, como frango e suco de laranja, sempre foram prejudicados pela lógica dos EUA de aumentarem com tarifas os preços dos produtos importados para serem menos competitivos do que os seus. A diferença agora é que "baterão de frente" com a China e a União Europeia, seus principais consumidores e fornecedores. Durante o primeiro governo Trump, os EUA jogaram para escanteio a Organização Mundial do Comércio (OMC), deixando claro não quererem se subordinar a decisões da entidade mundial de regulação do comércio internacional. Agora fizeram o mesmo com a Organização Mundial da Saúde (OMS). Usam sua imensa força econômica, comercial e bélica como bem entendem, sem mediação das Nações Unidas ou de qualquer foro mundial.
Quanto das declarações bombásticas de Trump se concretizarão em ações efetivas ainda é um mistério, mas ele não economiza em ameaças de retaliação, via tarifas (e sabe-se lá o que mais) para os países que substituírem o dólar por outra moeda, citando expressamente a do BRICs (e por tabela o Yuan). Mesmo sabendo que as relações entre nações soberanas não são mediadas por chantagens, Trump age assim porque não vê alternativa já que o dólar hoje é menos da metade do que foi até 2002, quando o euro começou a ser utilizado para valer. Há números diferentes, a respeito da utilização mundial das principais moedas – no sistema Swift, em 2024 o dólar dominava com 47%, e o Yuan é a quarta moeda mais importante, com quase 4% de participação, atrás apenas do dólar, euro e libra esterlina (ultrapassou o iene). É pouco, é verdade, mas há 15 anos o Yuan aparecia com 0,1%. Quando analisado pelo "Índice de utilização de moedas internacionais", do Federal Reserve dos EUA, o comportamento das cinco principais moedas evidencia o domínio absoluto do dólar, com 65,5% do total em 2023. Por esse índice, a evolução do Yuan também deve preocupar o governo dos EUA, já que a moeda chinesa saiu de irrisórios 0,02% em 2008, para 2,5% em 2023 (veja o gráfico ao final deste post). Conhecendo a velocidade com que as coisas costumam acontecer na China, não será surpresa se até o final desse ano chegar nos 10%.
Há diferentes avaliações a respeito dos resultados a serem obtidos pelas iniciativas de Trump, de taxar produtos importados pelos EUA – no caso do Brasil, anunciou 25% sobre o aço, ferro e alumínio, que em 2024 resultaram em vendas de mais de US$ 6 bilhões. Ainda não se sabe se, e quanto, essas medidas beneficiarão ou prejudicarão consumidores dos EUA. O que se tem certeza é que, no caso brasileiro, a paulada será sentida de verdade se as ações de Trump resultarem em aumento das compras de grãos e carnes dos EUA por parte da China – algo que ocorreu no final do primeiro governo Trump –, em detrimento das compras chinesas desses produtos do Brasil. Isso porque não temos outra China a quem vender tantos grãos e carnes. Como o Agro do Brasil apostou muito em um único megacliente, uma redução de 20% das compras chinesas de soja e carne bovina resultará em um desastre no setor empresarial da agropecuária brasileira.
Daí a verdadeira importância, para o Brasil, das ações de Trump em relação à China, seu grande concorrente/adversário no mercado mundial. As importações da China beneficiam os EUA, apesar do montante (US$ 439 bilhões em 2024) impressionar, porque são produtos com preços mais acessíveis, e isso ajuda no controle da inflação. O que realmente incomoda o governo Trump é o déficit (de US$ 295 bilhões no ano passado), porque as vendas dos EUA para a China foram de US$ 143,5 bilhões no período. E os crescentes déficits na balança comercial dos EUA com a China é que ajudaram a reserva cambial chinesa a ser de mais de US$ 4 trilhões (hoje é menor, na faixa de US$ 3,5 trilhões), liquidez que lhe permite ousadias do porte da Iniciativa Cinturão e Rota (BRI, na sigla em inglês), a engenhosa articulação comercial e de logística mundial da China que incomoda bastante os EUA. Prova disso foi a ação imediata do governo Trump no Panamá, obrigando e conseguindo que o governo daquele país saísse do Cinturão e Rota.
Coerente com o que acabou de fazer no Panamá, prega para Gaza, e aspira fazer no Canadá e Groenlândia, Trump deverá pressionar o Brasil para o governo desistir da construção da ferrovia na região Oeste, a tão sonhada saída pelo Pacífico de produtos brasileiros para a Ásia, elevando a nossa competitividade internacional. Traduzindo, ainda que a prudência recomende não entrar em "briga de cachorro grande", agora não tem mais jeito: o Brasil está no meio do rolo China e EUA, e é alvo das disputas de empresas e governos dos dois países nos setores do agronegócio, mineral, montadoras, energia...
Exemplo do tamanho e complexidade da encrenca são os segmentos dos combustíveis fósseis e etanol e dos veículos elétricos: carros, utilitários, caminhões leves e caminhões pesados. Com os elétricos crescendo ano após ano, pode-se estimar que daqui a alguns anos a maior parte das frotas no Brasil serão de veículos movidos a eletricidade. No caso dos caminhões pesados, haverá uma verdadeira revolução, não apenas por causa da substituição de um combustível por outro, mas pela entrada de montadoras e empresas de recarga chinesas, como ocorreu com carros e utilitários.
Outro setor no qual a China incomodará os EUA é o de máquinas, equipamentos e insumos para a agricultura familiar, os muitos milhões de pequenos e médios estabelecimentos agropecuários em todo o país que historicamente sofrem todo tipo de dificuldades, agravadas nos últimos anos pela redução populacional e o envelhecimento de quem atua diretamente na produção. A menos que haja muito interesse dos EUA por esse mercado capilarizado e tecnologicamente atrasado, teremos "made in China" do Rio Grande do Sul ao Amazonas, com os estados do Nordeste à frente.
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