Coisas da nossa cabeça
O leitor já deve ter reparado que as embalagens da Coca-Cola mudaram. Os rótulos e as latas das versões Zero e Stevia estão, agora, em grande parte preenchidos pelo vermelho da Coca-Cola clássica, reservando a espaços relativamente diminutos os tons de preto e verde que as identificavam anteriormente. O motivo declarado da mudança, segundo o VP de marketing da companhia, é sugerir ao consumidor que todas as versões contêm o sabor da Coca-Cola original, como prevê o novo posicionamento da companhia, que deixa de enfatizar um sentimento (“Abra a felicidade”) para realçar benefícios e atributos mais concretos do produto (“Sinta o sabor”).
Para os consumidores, em um primeiro momento, a alteração estética pode parecer apenas um incômodo, dado que a identificação das diferentes versões, nas prateleiras, tornou-se menos imediata. Numa era na qual atalhos visuais são tão relevantes, ter de parar por alguns segundos antes de escolher o refrigerante talvez pareça uma demasia para muita gente – e um risco para as vendas da própria companhia.
No entanto, convém dar um período de carência para que a mudança demonstre os primeiros resultados, pois a expectativa de que, ao longo do tempo, consumidores passem a avaliar melhor o sabor das várias apresentações da Coca-Cola não é despropositada. A experiência mostra que fatores alheios a produtos alimentícios acabam por influenciar a percepção de sabor, e a embalagem talvez seja o mais forte deles.
Alguns exemplos. Anos atrás, o refrigerante de limão 7 Up, da PepsiCo., adicionou tons de amarelo à embalagem – e os consumidores passaram a sentir notas mais acentuadas da fruta na bebida. Testes já mostraram que as pessoas julgavam melhores os doces contidos em embalagens de vidro, em relação às de alumínio, mesmo quando os conteúdos eram exatamente iguais. O vidro sugeria um produto mais caseiro, artesanal, enquanto a lata lembrava itens industrializados. E a margarina só se tornou um sucesso comercial porque mudou de cor, tornando-se amarela como a manteiga e deixando para trás o branco inicial.
Não apenas o visual impacta nossa percepção de sabor ou de qualidade. As linguagens comercial e publicitária e o ponto-de-venda onde o produto ou serviço é oferecido também são decisivos para a experiência de consumo. No fundo, nada do que vivenciamos está imune a influências externas ou produzidas pelo nosso próprio estado de espírito. Por isso, volta e meia degustações às cegas mancham a reputação de supostos connoisseurs, como os “someliês de água” que, em um concurso de versões gourmet da bebida, outorgaram um honroso terceiro lugar ao líquido proveniente do rio Tâmisa, de Londres...
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