Muito além do greenwashing
Recentemente o Conar britânico determinou a retirada de circulação de alguns anúncios da Lacoste e da Nike. Motivo: continham apelos sustentáveis que, na prática, não se sustentavam – i.e., exageravam pretensas vantagens ecológicas de seus produtos.
Uma bela medida para coibir o greenwashing, não fosse, esta, apenas uma de suas formas de manifestação. O verdadeiro palco do boicote à transição energética e a padrões de consumo menos deletérios ao meio ambiente não reside na propaganda, ou não apenas nela, e sim em esforços de relações públicas que abrangem desde a publicidade até o lobby, como mostra um relatório da Oxford University.
Segundo a universidade, grandes multinacionais de RP "realizam pesquisas amigáveis à indústria, concebem campanhas publicitárias, mobilizam manifestantes de fachada e patrocinam sondagens de opinião pública" (p. 9) em prol de clientes dos setores econômicos mais poluentes. Ocupam, assim, o espaço digital e midiático constantemente com informação que lhes convêm.
Parte dessa ofensiva ficou visível mês passado, com a realização da COP em Belém. A Conferência foi em parte viabilizada pela Confederação Nacional da Agricultura (CNA), Vale e JBS, presentes em obras na capital paraense e/ou no financiamento aos estandes brasileiros desta e de outras edições. Além de patrocinadoras da cobertura de grandes veículos de imprensa nacionais, o que as ajudou a transmitir a impressão de "benfeitores da transição energética e da descarbonização" (Le Monde Diplomatique Brasil, nov. 2025, p. 5).
Estas iniciativas de bastidores repercutem da base (com a desmobilização popular) ao topo (nas instâncias internacionais de negociação). Da primeira é representativa uma pesquisa junto a jovens espanhóis que, em percentual surpreendente (40%), dizem considerar as ameaças sobre o colapso do clima exageradas. Do segundo, basta como exemplo o relatório final da última COP, que não menciona a expressão "combustíveis fósseis" nem define um cronograma para o fim do desmatamento.
Cenário irreversível? Não necessariamente. E curiosamente um insight para transformá-lo vem de um médico, e não de um ecologista ou diplomata.
Lembrando a luta contra o tabagismo no Brasil das décadas de 1980 e 1990, Dráuzio Varella foi claro ao identificar um turning point para o sucesso da empreitada: a proibição da propaganda de cigarros. "Isso foi definitivo. À medida que as empresas não podiam mais anunciar, perderam o poder de barganha com a imprensa. A imprensa era sustentada pelas companhias de cigarro. (...) [A]ntes você não podia falar um "a" sobre o cigarro."
O velho "siga o dinheiro" – ou, no caso, corte-o duma vez.
Veja mais notícias sobre MarketingBrandingGestãoAMANHÃ Sustentável.
Comentários: