O tempo e os ventos do mercado

Projetos de longo prazo e o risco que envolvem
A aposta da Airbus num avião para até 800 passageiros ocorreu concomitantemente à da Boeing em aviões de menor porte em relação ao europeu

Em tempos de pandemia, algumas notícias recebem menos destaque do que merecem. É o caso do A380, superjumbo da Airbus, cuja última unidade começou a ser produzida nesta semana e cujo fim da fabricação já havia sido anunciado no início do ano (relembre aqui).

Concebido em fins dos anos 1990 e em atividade desde 2007, o produto nasceu da aposta de que a demanda por voos internacionais iria se concentrar em grandes aeroportos e privilegiar aeronaves capazes de transportar a maior quantidade de passageiros possível em uma única viagem. Do desenvolvimento ao primeiro voo, passaram-se uns dez anos – tempo suficiente para que o produto entrasse em operação bem no início de uma crise econômica mundial.

O caso ilustra a dificuldade de empresas que precisam fazer investimentos mirando o longo prazo tomando como referência realidades econômicas e mercadológicas que nem sempre se confirmam com o passar dos anos.

Exemplos próximos não nos faltam.

No início de 2020, a Honda colocou em operação, no interior de São Paulo, uma fábrica que ficou pronta três anos atrás – e que desde então estava fechada, aguardando um melhor cenário econômico.

Um hospital particular de Porto Alegre fez pesados investimentos em sua área de oncologia – apenas para descobrir, com o tempo, que a demanda mais premente e rentável seria por leitos na maternidade. Um shopping, também da capital gaúcha, construiu um novo edifício garagem, visando acabar com o estresse da busca por vagas em dias mais movimentados. Inaugurou-o bem na época que os apps de transporte ganhavam popularidade, tornando a construção, atualmente, ociosa.

Se algo pode ser aprendido dos casos acima é que convém: 1. dosar os riscos; e 2. ser pragmático.

1. A aposta da Airbus num avião para até 800 passageiros ocorreu concomitantemente à da Boeing em aviões de menor porte em relação ao europeu. Os norte-americanos acreditavam em um transporte mais pulverizado entre aeroportos menores e distâncias mais curtas. Certa ou errada em relação às suas premissas de meados dos anos 1990, o fato é que a Boeing esteve mais próxima de sua área de expertise, projetando aviões que eram evoluções dos atuais, e não um grande e complicado salto frente ao que já faziam, como ocorreu na Airbus. Além disso, a companhia de Seattle jogava com uma outra vantagem: nem ela nem seus potenciais clientes dependiam de terceiros. Poucos aeroportos tinham infraestrutura para receber um avião do porte do A380, outro óbice ao sucesso do projeto europeu.

2. Sobre o pragmatismo: a Honda teve a frieza de concluir uma fábrica novinha em folha e deixá-la fechada esperando momento melhor para colocá-la em funcionamento. Assumiu que a aposta na economia brasileira não se confirmou e achou melhor não incorrer em prejuízos ainda maiores caso a pusesse em operação.

No mais, é tentar fazer do limão uma limonada. Um circuito de kart ajuda a diminuir o prejuízo que o edifício garagem causa ao shopping, enquanto ao hospital resta torcer macabramente para que os casos de câncer aumentem vertiginosamente...

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Sexta, 19 Abril 2024

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