Quem se espelha em quem?

Nos anos 1980, tudo o que vinha do chão da fábrica interessava de perto a nós que estávamos na ponta da exportação, auscultando os clamores dos clientes e periciando a competitividade adversária. Atentos aos progressos perpetrados pelos Círculos de C...
Quem se espelha em quem?

Nos anos 1980, tudo o que vinha do chão da fábrica interessava de perto a nós que estávamos na ponta da exportação, auscultando os clamores dos clientes e periciando a competitividade adversária. Atentos aos progressos perpetrados pelos Círculos de Controle de Qualidade (CCQ), esforçávamo-nos para sensibilizar a produção de que havia um "tsunami" em formação no horizonte. E ele atendia pelo nome de concorrência global. Ou bem nos tornávamos aptos para atingir os mercados de preços "premium", ou seríamos engolfados no Brasil por similares melhores e mais baratos. Só a qualidade agregava valor e ela deixava de ser optativa para ser vital. As notáveis contribuições de Deming e Juran tinham sido absorvidas e aperfeiçoadas no Japão. Do arquipélago, o sentencioso Akio Morita, da Sony, galvanizava o mundo com seu "walkman" e falava-se que Tóquio poderia superar Washington como a primeira economia do planeta.  


Numa comparação também despropositada, embora mais verossímil, a Coréia do Sul emulava em tudo o Japão. Quem saía de Tóquio e voava um par de horas até Seul, por certo tinha a sensação de que voltara trinta anos no tempo. Se o slogan coreano era o do "país das manhãs calmas", pois bem, ali parecia que nos três turnos respirava-se calma, quase letargia. Mas as aparências enganam e uma revolução educacional estava em franco curso. Tanto é que entre 1995 e 2010, esse delta quase sumiu. Correndo em paralelo, a China vinha se tornando para a Coréia o que esta fora para o Japão: uma fiel e aplicada aprendiz. Some-se ao cabedal chinês a cultura de negócios de Hong Kong e o vigor dos tigres afiliados – Taiwan e Cingapura –, a verdade é que Pequim logo seria a nova fábrica do mundo. Nesse jogo de inspirações cruzadas, a Índia seguiu as pegadas da China, com quem divide a primazia de abrigar o maior formigueiro humano, sendo ela também fragmentada em subculturas.


Ora, quem conhece a África, do Quênia ao Cabo da Boa Esperança, sabe que os indianos dominam o comércio e têm presença na vida política, ressalvadas as vicissitudes que pesam sobre imigrantes. O mesmo se aplica, aliás, aos sírio-libaneses que juncam a costa ocidental, da Libéria ao Congo. Não é demais dizer, contudo, que a África calca o modelo de desenvolvimento em Nova Déli, adotando o inglês como língua franca, e consagrando o empreendedorismo como forma de calar as diferenças das sociedades multiétnicas e estratificadas. No amálgama dos modelos, entra o capital chinês como fator de fomento. Bem ou mal, está estabelecido um Norte. Resta ver o que nós aqui no Brasil seremos. Quem é nossa referência? E quem há de querer imitar-nos a essa altura? No fundo, o que importa saber é que lugar nos cabe no amanhã. Saber mesmo, cá entre nós, ninguém sabe. Eis a essência de nosso drama. 

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Quinta, 25 Abril 2024

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