Sonhar com ilhas
Quando viajo mundo afora, gosto de conversar com os companheiros de geração sobre os planos que cada um tem para essa nova fase da vida. Aos 60 anos, boa parte deles já não pensa em permanecer nos centros onde cresceram ou viabilizaram a vida profissional. É claro que dado o perfil disfuncional dos filhos de uns poucos, estes não podem se mexer com a liberdade de que gostariam. Mas felizmente eles são uma minoria. A maioria das pessoas que conheço começa a partir para concretizar alguns de seus planos mais caros e coloca em seus radares lugares como Lanzarote, Vinhedo, Carpentras ou Alba. Quem pode, mantém suas instalações nos grandes centros onde construíram suas vidas. Outros vendem tudo e investem numa morada aconchegante e o mais perto que podem das delícias da vida comunitária. E nós, aqui no Brasil, o que fazemos nas circunstâncias?
Pois bem, parece fora de dúvida que o interior brasileiro, e aqui incluo a faixa costeira e seus remansos mais aprazíveis, sucumbiu à mesma catástrofe que assola as capitais. Digo isso porque pouco importa se você está no pequenino Sergipe ou nas vastidões de Minas Gerais, a rotina de explosão de caixas eletrônicos e assalto a carros fortes não parece dar o menor sinal de alívio. Muito pelo contrário, é voz corrente que é nas pequenas cidades que podemos virar alvos preferenciais de toda sorte de delinquência. Assim sendo, viver no Brasil demanda sorte e otimismo. E é lamentável que as pessoas tenham que desenvolver um sexto sentido que evite as surpresas desagradáveis, hoje tão comuns na paisagem urbana e rural de nosso país. Se é ocioso perguntar como tudo isso começou, vale contudo enfatizar o quão invejamos os povos quem podem passear pelas calçadas à noite.
Não sei se é por isso, mas cada vez mais tenho tido sonhos recorrentes com ilhas. Não faz muito tempo, sonhei com Simi (foto), no Egeu, uma das mais lindas que visitei. Da mesma região, já veio Kastelorizo, quase na costa turca, onde foi ambientado o filme "Mediterrâneo". E, certamente não fossem os borrachudos implacáveis, sonharia com a deslumbrante Ilhabela, no litoral paulista, opção que me permitiria manter prudente distância de São Paulo. No meu entender, e sobre isso conversaria com o terapeuta se tivesse um, acredito que a imagem insular me faz pensar em proteção contra as hostilidades do mundo. Afinal, nas ilhas todos se conhecem e fica mais difícil de delinquir. Pelas mesmas razões aludidas, a vida deve ser mais monótona e previsível, mas chega uma época na vida em que a adrenalina já não é o ingrediente vital que foi um dia. Pensando bem, ela pode ser fabricada de dentro para fora com um pouco de abstração.
Bom fim de semana.
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