Receita para a vida a bordo
Essa segunda-feira de julho está simplesmente feia no Recife. Dizem que semana passada a temperatura chegou a impensáveis 17° e as emergências hospitalares ficaram cheias. Tamanha provação equivaleu a se tivéssemos em São Paulo o termômetro a zero, com todas as consequências daí advindas. Hoje o panorama é simplesmente opaco, baço, sem a luminosidade que normalmente resplandece em muitos tons de verde e azul em quase todas as épocas do ano. Foi até por isso que fiquei feliz quando uma amiga me falou que parte nesta terça-feira para um cruzeiro de duas semanas no mar Egeu, Grécia, onde passará com amigos as próximas semanas numa embarcação pequena. Já na saída me pediu que lhe escrevesse três dicas, se as tivesse. Embora saiba que ela estará em companhia experiente, não custa resgatar de meu repertório alguns elementos que poderão ajudá-la a fazer dessa uma viagem inesquecível. Aqui vão elas:
1 – O grande segredo de uma temporada "al mare" está nas companhias. E, a tirar por ela, tenho certeza de que serão maravilhosas. Mesmo assim, é bom evitar sermos pesados, destilar mau humor e ter crises de temperamento. Numa embarcação pequena – para 20 pessoas, digamos, inclusive 5 tripulantes – nossas emoções contagiam facilmente quem está por perto e, tal como num "reality show", pode dividir a coesão do grupo. Como somos humanos e estaremos sempre sujeitos a ter altos e baixos, convém que nos ocupemos. E que estejamos prontos para facilitar a vida do outro, a lhe dar uma mão, a nos deixar em segundo plano. Se todos agirem assim, está aberto o caminho para uma temporada de muitas risadas, mergulhos nas águas claras e, no final, uma despedida calorosa. Os tripulantes normalmente são atentos ao clima que rola no grupo e, experientes que são, serão sempre fonte de orientação. Não convém esquecer, contudo, que eles estão ali trabalhando.
2 – Um truque muito efetivo para evitar transbordamentos nas horas mortas é ocupar-se. Fazer alguma coisa com as mãos. Mas, evidentemente, mexer no teclado do celular não é uma boa opção. Tampouco se recomenda o recurso patético à postagem seriada de fotos que retratem a mesa do café do manhã, o perfil de uma ilha ou um peixe recém-pescado. Tudo isso é até banal para quem recebe, mas é desgastante para quem está a bordo. As pessoas se sentem em segundo plano diante de adicções a joguinhos isolacionistas. No meu caso, da última vez que fiz uma longa viagem assim, evitava ficar o tempo todo lendo e fazia alguma coisa para o grupo. Tomei o encargo de fazer caipirinhas com limão, cachaça e açúcar brasileiros. Isso me deu identidade de bordo perante pessoas que eu já conhecia até bastante bem...em terra. Minha namorada na época se encarregou de fazer fornadas de pão de queijo no entardecer. Para isso levou alguns quilos de massa e o ritual maravilhava todos.
3 – Assim como eu, ela já passou dos 30 anos, logo convém tomar algumas precauções básicas, dessas que nunca integraram nosso repertório, mas que são imperativas nessas horas. A principal é com o sol. Mesmo porque um cochilo à tarde é o que há de maravilhoso nessas circunstâncias, o que nos poupa da canícula. É bom levar uma provisão de remédios e nunca, jamais, subestimar o mar. Mais do que antes, estamos sujeitos a câimbras, entorses e estiramentos. E esses males podem nos acometer na água, a uma razoável distância do barco. Ela falou de dicas culinárias. Pois bem, adoro a "bottarga" (ova de peixe) e ela vai muito bem quando ralada sobre a massa. Os peixes são indizíveis, mas evite os vinhos gregos. Use e abuse das saladas com queijo feta, das olivas e do azeite. Ali se comem os melhores tomates e pepinos do mundo. Se puder, peça ao comandante para parar em Kastelorizo, onde filmaram "Mediterrâneo". E em Simi, onde quero viver meus últimos meses, se tiver a escolha.
Boa viagem, minha querida amiga. Volte tão bem quanto foi.
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