O inimigo agora é outro

Petz e Cobasi se unem e dão razão a um dos pioneiros do marketing no Brasil
A fusão exigirá decisões sobre manutenção de marcas e pontos-de-venda, bem como a difícil construção de uma cultura organizacional própria

A notícia empresarial mais quente do primeiro quadrimestre foi a fusão entre as duas maiores redes de pet shop do país, Petz e Cobasi. E a justificativa das gigantes para se aliarem tornou-se um belo pretexto para voltar quase 30 anos no tempo e reler um dos decanos do marketing brasileiro. Segundo Sergio Zimerman, líder da Petz, os dois players viviam "uma guerra que sangra as empresas, e (agora) vão parar de gastar munição" (Estadão, 19/04). Uma guerra contra as pequenas lojas de bairro, que constituem a maioria absoluta dos estabelecimentos do setor, contra os sites chineses, que vendem produtos mais baratos, e, claro, uma contra a outra, na disputa pelos melhores pontos, preços e serviços (Valor Econômico, 22/04). Com a união das rivais, uma das frentes de batalha pode ser desativada em prol de ações conjuntas e o enfrentamento de inimigos em comum.

Uma medida que provavelmente seria respaldada por Raimar Richers (1926-2002), que em seu livro, "Surfando as Ondas do Mercado" (RR&CA Editora, 1995), afirmava que o mercado é feito de disputa e cooptação. Nele, tentar tirar um concorrente do jogo costuma ser perda de tempo, e competir de forma intensa, um tanto quanto extenuante. Por isso, aconselhava: "entenda-se com seus concorrentes" (p. 89). E ia além: "a concorrência só é sadia quando os competidores estão dispostos a negociar" (p. 90). Richers valia-se de argumentos econômicos, evidentemente, mas também biológicos, lembrando que, na natureza, espécies sobrevivem tanto pela capacidade de se enfrentar quanto de cooperar. Não sei se ele havia lido algo a respeito, ou se simplesmente intuía, mas mais recentemente pesquisadores das ciências naturais têm ido na mesma direção. Um deles afirma que "em ambientes (naturais) competitivos, os vencedores são aqueles que resistem à tentação de escalar conflitos". O mesmo parece valer para o meio empresarial.

Os responsáveis pelo deal Petz-Cobasi possivelmente nunca tenham lido Richers, mas sentiram na prática as ponderações do velho professor. "Quando cada uma abre loja, se gasta o dobro de capex [investimentos], o dobro de opex [despesas operacionais] para faturar 20%, 30% mais. Então, no final, o faturamento total até sobe bem, mas dividido", disse um analista ao Valor Econômico (19/04). Continuassem assim e provavelmente o mercado de produtos para animais de estimação acabasse se tornando bem menos atrativo para cada player separadamente do que passa a ser agora, atuando em conjunto. A fusão, claro, nada tem de trivial, e exigirá decisões sobre manutenção de marcas e pontos-de-venda (82% das lojas Petz está a até três quilômetros de uma unidade Cobasi, por exemplo), bem como a difícil construção de uma cultura organizacional própria. Nesse processo, a despeito das afirmações de que ambos os controladores mostram desapego em relação às companhias que criaram e estarão igualmente representados no conselho de administração, é provável que haja prevalência de um lado sobre outro. Dificilmente fusões ocorrem entre empresas de mesmo patamar em todos os quesitos.

Mas se quando eram concorrentes eles conseguiram se entender, não será agora, como sócios, que deixarão de fazê-lo. Ou não?

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Quarta, 26 Junho 2024

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