Medida preventiva
A promessa é tão ousada quanto repetitiva: reformar o serviço público. E veio da lavra de ninguém menos que Elon Musk, o empresário recém-nomeado por Donald Trump para a chefia do "Departamento de Eficiência Governamental" dos Estados Unidos. A intenção declarada é "desmontar a burocracia governamental, eliminar regulamentações excessivas, cortar gastos desnecessários" e, de quebra, publicar "uma tabela com os gastos mais insanamente idiotas". Uau!
A rigor, não há departamento nenhum: Musk funcionará como um mero conselheiro cujas atribuições se encerram no simbólico 4 de julho de 2026. O que, convenhamos, é pior, pois mal terá tempo de entender como funciona a complexa máquina governamental – e, dado que nem se imiscuirá no cotidiano da burocracia norte-americana, seus julgamentos duvidosos tenderão a ser mais enviesados ainda.
Mas vale refletir por que a cada quatro ou oito anos eleitos ocupam cargos nos Executivos do mundo todo dispostos a tornar o serviço público "mais eficiente" e, geralmente, quebram a cara. Há duas boas razões para isso.
A primeira e mais óbvia é a diferença entre os setores público, para os quais partidos e candidatos são ungidos periodicamente, e privado, de onde vêm ou tiram suas inspirações. Regidos por objetivos e horizontes de tempos distintos, seus modi operandi diferem também na importância que conferem ao respeito a processos pré-definidos e a seu ritmo de execução. São lógicas e timings por vezes incompatíveis.
A segunda razão é mais complexa. Uma vez um grupo seja constituído, sob a forma de autarquia, empresa, departamento ou qualquer coisa do tipo, ganha vida própria e passa a se comportar de maneira particular. Esta reflete, em parte, a missão para o qual foi criado, mas também suas necessidades de subsistência – a manutenção dos empregos, em suma. Daí que qualquer decisão vista como ameaça a esses dois sustentáculos, missão e manutenção, seja repelida ou boicotada. Em alguns momentos, por motivos nobres, como a prestação de bons serviços públicos; em outros, nem tanto, como conservação de privilégios, baixo nível de cobrança e certa acomodação.
Promessas de início de mandato como estas de Trump & Musk são comuns a todos os partidos e bradadas até por candidatos mais moderados, mesmos nos Estados Unidos. Um servidor de carreira já afirmou que "o grupo novo chega e acha que o governo anterior e o funcionalismo são preguiçosos ou estúpidos. Daí começam a conhecer de verdade o lugar que estão gerindo. E, quando vão embora, falam: 'É um trabalho bem difícil mesmo, e essas são as melhores pessoas com quem já trabalhei" (p. 15).
Talvez a opção por fazer de Musk um consultor, e não funcionário efetivo, seja no fundo uma forma de conservar preconceitos e não colocar em xeque as simplificações mentais dele e de quem o nomeou. Vá que ele assuma o cargo e conclua, ao fim de seu mandato, coisa parecida com a de tantos antecessores?
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