Somos todos Bel Pesce?

Se por acaso você andou por fora das redes sociais nas últimas duas ou três semanas, talvez precise ser explicado do caso.  Um blogueiro decidiu investigar o currículo de Bel Pesce, conhecida como “a menina do Vale do Silício”. Descobriu que alguns d...
Somos todos Bel Pesce?

Se por acaso você andou por fora das redes sociais nas últimas duas ou três semanas, talvez precise ser explicado do caso. 

Um blogueiro decidiu investigar o currículo de Bel Pesce, conhecida como “a menina do Vale do Silício”. Descobriu que alguns dos feitos da moça eram um tanto quanto inflados, ao menos aparentemente (leia aqui). Teve início uma discussão que rendeu, então, um post do editor do Mundo do Marketing em que afirma haver muitas Bel Pesce no mercado – ou seja, produtos, serviços, marcas e profissionais que prometem mais do que entregam (leia aqui).

Bel Pesce apressou-se em esclarecer e rebater os questionamentos sobre sua biografia, conforme podemos ver aqui  e aqui. Mas, independentemente de quem tenha razão nessa polêmica, vale a discussão: não seríamos todos – empresas, marcas e profissionais –  exageradores das nossas virtudes e de nossas realizações?

Em parte, sim. E não é difícil entender por quê. Mercados são uma disputa de promessas e de aparências, em primeiro lugar. Ser escolhido em uma gôndola de supermercado ou em um processo de seleção de emprego depende tanto do conteúdo quanto da embalagem, quando não mais da segunda. Quantos produtos honestos e bem-feitos não acabam atropelados por concorrentes inferiores que simplesmente investem mais em publicidade, por exemplo? E quantos profissionais já não ouviram a recomendação de que precisam “saber se vender” para pleitear oportunidades melhores na carreira, uma vez que competência não lhes falta? 

No caso de Bel, parece que algo nesse sentido ocorreu. A fim de se vender como alguém com experiências profissionais únicas, superestimou meros summer jobs que fez ao longo da faculdade. E ao tentar provar que seu empreendedorismo não era de fachada, desdobrou sua única empresa brasileira em um miniconglomerado de quatro ou cinco negócios independentes. 

No entanto, quando estamos na posição de consumidores ou de recrutadores de recursos humanos, tendemos a cultivar uma saudável desconfiança da publicidade e dos currículos que nos chegam. Não somos tão ingênuos a ponto de comprar tudo o que é dito ou escrito – e é exatamente esse resguardo que faz do mercado uma selva razoavelmente disciplinada e funcional. 

Por isso, o que mais chama a atenção no “Pescegate” é menos a disposição da garota em envernizar seu CV do que a falta de checagem daqueles que compraram seu discurso  – e, pior, lhe ofereceram generosos espaços em rádio, TV, jornal e internet. A imprensa, afinal de contas, é o filtro através do qual só deveria passar o que é relevante e verdadeiro. Não são os jornalistas os “curadores” de conteúdo dos tempos atuais? 

Um blogueiro desfez o mito Pesce em um mísero dia, sem telefonemas ou viagens – só na base do Google. Não faltariam tempo nem recursos para um editor-chefe escalar um estagiário de primeiro semestre para proceder escrutínio parecido. Se o que não faltou foi checagem, teremos de acreditar que muitos veículos consideraram um diploma do MIT como credencial suficiente para alguém dar lições de empreendedorismo. Ou, o que é pior, que não se importaram com a falta de predicados práticos da moça, pois estavam mais interessados em construir uma personagem, tal qual ocorre no mundo do espetáculo.

Agora, me deem licença que vou editar meu perfil no LinkedIn. Tenho de tirar “mandarim” da lista de idiomas que domino.

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Quinta, 12 Dezembro 2024

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