Substituição tributária tira competitividade do setor vinícola
A venda de vinhos e espumantes brasileiros no mercado interno apresentou um leve recuo de 0,8% nos primeiros seis meses do ano, na comparação com o mesmo período do ano anterior. Para o setor produtivo, apesar de os espumantes terem apresentado resultado positivo de 9,7%, com a comercialização de 4,3 milhões de litros, a venda de vinhos tranquilos, que representa o maior volume comercializado, e que totalizou 88,4 milhões de litros, teve uma pequena retração de 0,9%. Por sua vez, os sucos de uva 100% prontos para consumo recuperaram o ritmo de crescimento, ampliando a venda em 32,7% e somando 60,1 milhões de litros. “Tivemos dois anos com as vendas estabilizadas, devido a uma série de fatores, como a quebra histórica da safra 2016 e a crise econômica brasileira. Tínhamos uma expectativa de melhoria das comercializações, mas isso está ocorrendo de forma bastante gradual. Há alguns nichos com bom desempenho, como os espumantes, em especial os moscatéis, mas estamos cautelosos devido à estagnação da venda de vinhos tranquilos”, explica Oscar Ló, presidente do Instituto Brasileiro do Vinho (Ibravin).
Apesar dos dados de venda de algumas categorias estarem positivos, o conselheiro do Ibravin pela União Brasileira de Vitivinicultura (Uvibra), Deunir Argenta, pondera que o setor está temeroso por causa da baixa rentabilização dos elos produtivos. “Os números expressam as vendas dos volumes para o mercado, mas não está havendo a rentabilização das empresas. Para muitas, essas dados refletem apenas escoamento da produção. Estão vendendo com margens apertadíssimas, quase sem lucro, para não perdermos a venda e também abrir espaço para a safra que virá na sequência”, observa o dirigente. Ele explica que a carga de impostos e sistemática de cobrança no Brasil coloca o setor em grande desvantagem frente aos produtos importados. “Temos uma carga tributária fora do comum, além do sistema de Substituição Tributária (ST) que cria uma concorrência desleal em relação aos vinhos que ingressam no país. Estamos trabalhando em todos os níveis, no Estado, mostrando que está havendo perda de arrecadação com a ST, e junto ao Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), para a retirada dessa cobrança antecipada. Assim, teremos uma melhoria na nossa condição de concorrência”, argumenta.
A participação dos rótulos importados no mercado brasileiro também ficou positiva em 5,2% nos primeiros seis meses do ano. De janeiro a junho, ingressaram no país 53 milhões de litros de vinhos e espumantes, representando alta de 5,3%. Já os sucos de uva tiveram recuo de 16%, com a entrada de 100,6 mil litros. Segundo estudo encomendado pelo Ibravin, 30% das importações foram feitas de forma direta pelos supermercados no primeiro semestre. “A tributação do vinho brasileiro é bastante alta. O vinho importado chega ao país com subsídio. Eles pagam tributos sobre o valor declarado na entrada, que é inferior ao praticado na ponta, na venda ao consumidor, e não precisam adiantar os impostos. Essa sistemática é diferente para os vinhos brasileiros. A indústria paga antecipadamente sobre a projeção do valor final de venda. Precisamos mudar isso antes de perdermos ainda mais espaço. Não queremos vantagem frente ao produto de outros países, mas precisamos que a ST não seja cobrada de forma antecipada do setor vinícola brasileiro, pois isso nos tira a competitividade perante o importado”, esclarece João Carlos Zanotto, conselheiro do Ibravin pela Associação Gaúcha Vinicultores (Agavi).
Representantes do setor vitivinícola colocaram às autoridades federais a preocupação com a perda de competitividade tendo em vista o aumento nas importações em reunião nesta semana em Brasília. Em 2017, o crescimento do ingresso de rótulos estrangeiros no país foi de 36,4%. Para os dirigentes, a cadeia produtiva brasileira tem encontrado muito pouco respaldo quanto aos pleitos que são encaminhados às diferentes esferas públicas. Com forte descapitalização e operando com baixíssima rentabilidade, o setor corre o risco de se desestruturar e se tornar inviável enquanto segmento econômico. Atualmente, no Brasil a produção de uva é baseada na pequena propriedade familiar, enquanto que a de vinho é realizada majoritariamente por pequenas e médias empresas familiares. A cadeia produtiva envolve 20 mil famílias produtoras, cerca de mil vinícolas e aproximadamente 100 mil pessoas empregadas diretamente apenas na região Sul do país.
“Mesmo com todas as adversidades, o Brasil está sendo reconhecido internacionalmente como um produtor qualificado de vinhos. E o enoturismo também vem ampliando seu potencial e se constitui em uma ferramenta de geração de renda e distribuição de receita nas regiões onde se desenvolve. O setor está bastante comprometido com a qualificação da produção. Precisamos de políticas públicas que nos auxiliem, senão, não há como sobrevivermos. Os produtores europeus, chilenos e argentinos são muito bem atendidos dentro de seus países”, pondera Márcio Ferrari, vice-presidente do Ibravin, mencionando os principais países importadores de vinhos no mercado interno brasileiro.
Os dirigentes apresentaram um documento no qual contextualizam as condições de sensibilidade dos vitivinicultores frente a falta de políticas públicas, salientando os pontos que consideram vitais para a sobrevivência do setor e que vem sendo negligenciados historicamente pelo governo. “Os produtores europeus, que produzem em larga escala, contam com empresas muito bem consolidadas, e que recebem mais de 1,2 bilhão de euros em subsídios todos os anos enquanto que a realidade brasileira é totalmente adversa”, observa Carlos Paviani, diretor de Relações Institucionais do Instituto Brasileiro do Vinho (Ibravin).
As lideranças presentes nas reuniões voltaram a solicitar medidas que há anos vem sendo apresentadas ao governo e que contemplam a redução da carga tributária – que no país, para os vinhos brasileiros, chega a atingir mais da metade do preço final de uma garrafa – simplificação da cobrança de impostos e redução da carga tributária, ampliação do crédito para investimento em inovação e modernização e melhores condições de controle e fiscalização da produção nacional e das importações bem como a implementação efetiva do Cadastro Vitivinícola Nacional. Estas proposta poderiam compor um programa de consolidação e crescimento do setor vitivinícola no Brasil, com a implantação realizada de forma gradativa, com duração mínima de 10 anos e possibilidade de prorrogação.
“Frisamos a importância de revisão do IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) que, desde que houve o aumento da forma de cobrança em 2016, não foi resolvido, e também pedimos uma ação coordenada junto ao Ministério da Fazenda e ao Confaz (Conselho Nacional de Política Fazendária) para a retirada do vinho do sistema de Substituição Tributária. Isso seria o mínimo para podermos dar um fôlego para as empresas e estancar a pressão sobre os custos e melhorar a competitividade dos nossos produtos”, explicou Deunir Argenta, que preside a Uvibra.
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