Momento McDonald´s
Quando visitei os Estados Unidos pela primeira vez, ainda adolescente, era inegável o fascínio que exerciam os arcos dourados da cadeia McDonald´s – hoje com espantosas 14 mil lanchonetes no país. Ao longo dos anos, acompanhei a abertura da primeira filial de São Paulo e, pelos acasos da vida, até a de Moscou, onde filas enormes se formavam na praça Púshkin. Tão grande é sua cobertura geográfica que o índice Big Mac, nome de batismo de um copioso sanduíche da casa, ainda hoje é razoavelmente sintomático da medição do custo de vida de um país. Isso dito, soube ontem que a cadeia planeja fechar duzentas lojas aqui, no primeiro movimento de retração, desde 1970. Ao todo, serão 700 franquias desativadas entre as locais, as da China e as do Japão.
Embora não seja um especialista do ramo, tenho legítima curiosidade quanto a quaisquer ícones culturais de um povo. Perguntei assim a meus dois jovens sobrinhos o que estava acontecendo. Eles então me levaram para jantar na grande ameaça à hegemonia abalada: o Chipotle Mexican Grill que começou no Colorado e cuja expansão ameaça se tornar viral. Lá, disseram, se paga um pouco mais, mas a comida é fresca e saudável. O que comi, confesso, não me encantou. Tampouco o ambiente. A música estava nas alturas, os atendentes eram mal treinados e a confecção dos pratos mexicanos clássicos estava longe de espelhar a excelência operacional do líder. Mas, aparentemente, chegou para ficar. No dia seguinte, passeando pela avenida Michigan, escutei uma conversa mais didática.
Joe Hungerford, velho amigo, disse que a rede McDonald´s estava agora empenhada em corrigir um sério erro de avaliação: tentou servir a dois senhores e terminou desagradando a ambos. Como assim? Ora, quem vai a seus restaurantes, está pronto para um lanche calórico. Seja de regra ou exceção, o cliente não quer ser lembrado de que existe salada de frutas e wraps de frango diet. Já os adeptos de comida deliberadamente saudável – até mesmo orgânica –, não entrarão num McDonald´s por mais repaginado que ele esteja. São coisas da memória ancestral do consumidor. O resultado é que a rede já não divulga mais balanços mensais e está tentando recuperar os fiéis do passado. Só que correm na paralela redes como Panera Bread e Shake Shack, além das asiáticas. O que vai acontecer? Não sei.
Talvez mais importante do que a resposta, seja a reflexão. Sempre que estou em Chicago, lembro da trajetória do velho Ray Kroc, o pai da rede. Vendedor de copos de milk shake, baseado aqui, observou que dois irmãos da Califórinia, de nome McDonald, faziam um movimento inusitado ao atrair as famílias refratárias aos drive-ins e às atendentes sobre patins. Com esse fluxo de gente conservadora, eles melhoraram a eficiência operacional, logo as vendas. O velho Ray fez uma oferta para franquear o sistema. O resultado é bem conhecido. Ao longo dos anos, a atividade imobiliária foi tão ou mais importante do que as batatas fritas e as tortinhas de maçã. Goste-se ou não, é um símbolo. E que fique o alerta para que não se tente cobrir um santo, descobrindo o outro. Aqui concorrência é tudo. Pulsante, cruel e incessante.
Mais do que qualquer coisa, vale dizer que um gigante desse naipe só poderia ter nascido nesse País onde pensar grande é um credo.
Fernando Dourado Filho é consultor em internacionalização de empresas e confeencista.
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