As jabuticabas tributárias fazem o Brasil ser injusto

Acostumado a defender as causas da indústria no campotributário, o advogado Rafael Nichele (foto), 41 anos, terá um novo desafio apartir da próxima segunda-feira (16). Ele presidirá até 2018 o Instituto deEstudos Tributários (IET), uma das mais impor...

Acostumado a defender as causas da indústria no campotributário, o advogado Rafael Nichele (foto), 41 anos, terá um novo desafio apartir da próxima segunda-feira (16). Ele presidirá até 2018 o Instituto deEstudos Tributários (IET), uma das mais importantes associações jurídicas doRio Grande do Sul. O IET, que tem foco no estudo, pesquisa e difusão do DireitoTributário, também pretende ser um interlocutor para debater com todas asesferas de poder a repercussão da alta carga tributária para a economia. No anoque vem, inclusive, o instituto promoverá um simpósio para discutir o tema.Nichele é mestre em Direito Tributário pela PUCRS e juiz do TribunalAdministrativo de Recursos Fiscais (TARF/RS), indicado pela Federação dasIndústrias do Estado Rio Grande do Sul (Fiergs).

Nichele não poupa críticas ao governo federal que não gerareceitas, uma função que a iniciativa privada tira de letra. “Empresas sabemobter lucro fazendo mais com menos, algo que o Estado não sabe fazer”, diz elelembrando, ainda, que a União prefere fixar os impostos em premissas queimpedem o desenvolvimento industrial. “No país, chegamos a tributar despesas.Um exemplo clássico é a carga tributária sobre salário ou demissão defuncionários. São realidades onde não há capacidade contributiva a serrevelada, ou seja, são jabuticabas tributárias”, desabafou na tarde de quarta-feira(9), horas antes da agência de classificação de risco Standard & Poor'sanunciar o corte da nota de crédito do Brasil, retirando o selo de bom pagadordo país. Acompanhe, a seguir, os principais trechos da entrevista concedida aoportal AMANHÃ.

Qual a maior preocupação da indústria em relação à atualordem tributária?

Com certeza é a segurança jurídica dos negócios, ou seja, não raroempresários são pegos de surpresa por anúncios de aumento de impostos. Aindaque se respeite o prazo de 90 dias para que a norma passe a valer, isso minacom um mínimo de previsibilidade econômica e financeira que uma boa gestãopossa ter. Vejo que está havendo um duelo cada vez mais sério entre o poderconstitucional de tributar e a evidente necessidade de aumento de arrecadaçãopara dar conta dos gastos públicos. No cenário estadual, por exemplo, umaumento de ICMS sempre será repassado para a mercadoria e quem mais sofre éaquele que tem menos capacidade econômica.

Por qual razão isso acontece?

Pelo fato da tributação brasileira ser injusta, pois ela é fixada em premissasque impedem o desenvolvimento industrial. No país, chegamos a tributardespesas. Um exemplo clássico é a carga tributária sobre salário ou demissão defuncionários. São realidades onde não há capacidade contributiva a serrevelada, ou seja, são jabuticabas tributárias. Essa realidade também refletevários tributos que incidem sobre uma mesma mercadoria: há imposto federal comoo IPI, tem o estadual (ICMS), tributação sobre faturamento, contribuição sobreo lucro e imposto de renda. São, no mínimo, uns cinco tributos incidentes.

Como você vê analisa o atual debate sobre novos reajustesde impostos e a possibilidade de cortar gastos?

Essa discussão nunca vai deixar de existir, pois o aumento de arrecadaçãodepende da atividade econômica e do legislador. Quem pagará a conta, no fim, équem produz, pois o Estado não gera receitas – esse é uma função da iniciativaprivada que faz sua parte obtendo lucro fazendo mais com menos, algo que oEstado não sabe fazer.

Existe alguma solução para a questão tributária noBrasil?

Não existe mágica. Fazendo uma retrospectiva, o que se vê é que a primeirasaída para melhorar a questão do caixa dogoverno no curto prazo é aumentar a tributação. No entanto, devemos dar um passoatrás para solucionar esse problema. Pode parecer chavão, mas melhorar o nívelde desenvolvimento humano faz com que as pessoas galguem melhores posições nomercado de trabalho. Um programa social não vai mudar a atitude das pessoas,pois falta motivação de fazer um movimento diferente. A grande questão é que osinvestimentos públicos e sociais estão cada vez mais ilimitados. Isso até podesolucionar um problema imediato de minar com a miséria, mas não faz que aspessoas ascendam socialmente.

A sua aposta é na educação.

Exato. Basta nos espelharmos em exemplos como o do Chileonde há investimento em educação básica. Já no Brasil optamos por dar essaprerrogativa para estados e municípiosenquanto a União fica responsável pelo ensino superior.  Isso também temuma justificativa na distribuição da carga tributária que fica mais concentradano governo federal. Por essa razão o nível de educação superior é aceitável nopaís, mas me diga um nome de colégio estadual que seja referência. Daí seentende também a razão pela qual nosso nível de competitividade industrial sejatão baixo. Comparado com outros países, precisamos ter um ou dois funcionáriosa mais na linha de montagem para dar conta da produtividade. Caso tivéssemosmenor carga tributária, esse empregado poderia receber um valor maior desalário, se qualificar e, por consequência, aumentar sua produtividadeindividual.

Há uma carga ideal que o Brasil deva perseguir tendoem vista que hoje a carga tributária equivale a cerca de 38% do PIB, atualmente?

Nesse caso, o grau de comparação com outrospaíses não é perfeito. Há locais onde a tributação alcança até metade da renda,mas não existem uma série de tributos que tem aqui. Nesses mesmos lugares, também não se gasta com serviços essenciais comosaúde, segurança e educação. Ou seja, talvez alguém lá fora possa convivermuito bem com uma carga tributária elevada ao ver que são concedidos serviçospúbicos de alta qualidade. A preocupação não deve ser tanto o volume da carga,mas onde ela incide. No caso brasileiro, é preciso que ela pare de ocorrersobre custos de produtividade. A solução seria mudar o vértice da tributaçãobrasileira para ter outras bases de cobrança. Veja o movimento feito em 2010onde foi retirada a tributação sobre folha de pagamento. Foi algo aplaudidopelos empresários, pois o governo passou a cobrar por um custo variável e nãomais fixo. No entanto, agora se aumentou o percentual de imposto sobre ageração de folha. Desse modo, vai ficar mais em conta voltar a pagar 20% sobrea folha do que a norma atual. Ou seja, a desoneração terminou por uma viatransversa. 

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Quinta, 12 Dezembro 2024

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