Lições organizacionais...
Governos são organizações. Têm lá suas particularidades, obviamente, das quais a principal é depender de eleições a cada quatro anos para ser constituídos ou desfeitos. Mas uma vez formados, funcionam sob condições não muito diferentes daquelas que observamos todos os dias em empresas. Por isso, fica fácil identificar comportamentos típicos do mundinho corporativo quando se assiste a cenas como as da reunião ministerial de 22 de abril, divulgadas na última sexta-feira.
Há, por exemplo, o momento autocomunicação. Aquele em que os ministros reafirmam os princípios que elegeram o presidente e que têm sido a marca da maior parte de suas manifestações até aqui: oposição ao establishment, discurso anticorrupção e defesa de valores tradicionais. Reforçar o que une os presentes é fundamental para que a fagulha do questionamento ou do dissenso não ouse aparecer, principalmente em situações de tensão, como a atual.
Há o momento happy talk (definição aqui, em inglês). Aquele em que os ministros fazem questão de trazer boas notícias ao presidente, ainda que tudo pareça tão turbulento e incerto lá fora: investimentos, recorde na produção de grãos, elogios de parceiros internacionais etc. Ouvindo-os falar (e acreditando no que eles dizem), não admira que governantes em geral pareçam sempre um pouco alienados, incapazes de entender por que jornalistas e populares divergem tanto daquilo que escutam de seus comandados. Dentro da sala de reuniões, tudo parece sob perfeita ordem, e o futuro, promissor.
Há o momento discurso do chefe. Em que ele se vale da posição de comandante para desabafar, cobrar, reclamar – não importa muito se com razão ou se sobre temas relacionados aos que vinham pautando a reunião. Chefes têm essa prerrogativa, o que se há de fazer? Mudam o rumo dos debates, transformam o ouvido alheio em penico, fazem de qualquer mesa um palanque. Por menos conteúdo aparente que tenham, são as manifestações mais importantes de encontros como esses, pois vêm de quem decide. Todos podem se distrair e devanear enquanto um colega faz a sua exposição, mas quando é o mandachuva que pede a palavra, convém ficar atento: um recado cifrado – ou o que é pior, direto – pode ser destinado a qualquer um dos presentes, e sempre é bom saber quem anda nas graças do líder e quem anda meio escanteado (até para avisar a imprensa, depois, em off).
E, claro, existe aquilo que permeia toda reunião que se preze, não necessariamente como um momento específico, mas sim infiltrado em cada fala, em cada aparte: a sublime arte de FMDO (falar mal dos outros; saiba mais aqui). Oposição? Imprensa? Adversários políticos? Outros poderes? Tudo é devidamente xingado, vilipendiado, ofendido, caluniado. É, disparado, a melhor parte de qualquer reunião, para quem fala e para quem ouve.
Mas a mais perigosa, também. Por isso, antes de praticá-la, convém sempre dar uma olhada em volta ou até perguntar para o colega ao lado: "estão gravando?".
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