Angry birds
Elon Musk chegou chegando.
Tão logo comprou o Twitter, pôs fim ao trabalho remoto, demitiu metade do pessoal e exortou os funcionários que permaneceram a virar noites no escritório (e nem estes poupou do desligamento). Exemplo de insanidade, antiliderança e outros tantos adjetivos? Não para seus homólogos do Vale do Silício.
Segundo The New York Times, "muitos executivos, fundadores e investidores de tecnologia expressaram sua admiração por Musk" nas semanas que se seguiram às medidas de impacto tomadas pelo novo controlador. Apesar de todo o escarcéu gerado pela chegada do empreendedor ao comando da rede social, os CEOs entrevistados pelo jornal norte-americano disseram que o "estilo severo de gerenciamento" nada mais é do que "um corretivo necessário".
Corretivo ao que, exatamente? Ao fato de as companhias de tecnologia terem cedido "muito poder a trabalhadores". Os presidentes precisariam, então, "começar a recuperar esse poder", o que significa "cortar empregos, eliminar benefícios, punir dissidentes internos, resistir aos esforços de diversidade e inclusão e forçar os funcionários a voltarem ao escritório". Para eles, "os departamentos de RH foram longe demais em suas políticas". "Os trabalhadores devem deixar de ser ativistas e se concentrar em fazer seu trabalho", conclui o Times.
Provavelmente os CEOs em questão conhecem a realidade do Twitter tão bem quanto eu e você – ou seja, pouco a ponto de poder opinar com tamanha convicção. Mas nem precisaria. Só o fato de o novo dono impor um corte radical de empregos já vale por mil palavras (ou algumas poucas): "quem manda sou eu". O poder é feito de símbolos; eis a razão de tamanha aprovação.
CEOS podem muito, mas não podem tudo. Têm de se submeter ao mercado (inclusive de trabalho), aos stakeholders, à opinião pública e aos imperativos das relações públicas. O apoio a Musk mostra que, por trás de todo discurso bonito de ESG, inclusão, diversidade e ambientes de trabalho sadios, havia (e há) os narizes torcidos daqueles dispostos a fazer a balança pender novamente para o lado do comando-e-controle à moda antiga.
Não surpreende. Por mais modernosos que pareçam, esses gestores cursaram MBAs que não ensinaram a implantar grupos de afinidade ou a lidar com "diretores de felicidade", nem a custear benefícios trabalhistas heterodoxos ou ambientes de trabalho que se confundem com playgrounds. Foram forjados em escolas que pregavam unidade de liderança, hierarquia e foco no resultado. Durante seus mandatos, viram-se colhidos por uma onda que colocou o ativismo na agenda empresarial, e tiveram de aderir a contragosto. Quando a maré do mercado de trabalho virou, abriu-se o caminho para a desforra.
Gerir uma empresa é sentir-se no controle, ainda que ilusoriamente. Quando a agenda de um executivo começa a pipocar de compromissos que mais parecem os de um partido político, ONG ou órgão público, o desconforto é óbvio. A conexão de uma companhia ao air du temps não a isenta de apresentar resultado, e é por ele que CEOs respondem. Distrações nunca serão bem-vindas. E a primavera ativista era, sob a ótica desses dirigentes, uma distração.
Mas que pode deixar um legado – tema do próximo post.
Comentários: