Um país inimigo do vinho

Temos muito a progredir ainda no serviço desta bebida no Brasil

Reúno aqui algumas histórias presenciadas por mim ou mesmo por outras pessoas sobre o universo do vinho. Elas revelam como ainda é preciso melhorar o serviço da bebida ou, ainda, as técnicas de venda e outros detalhes. O Brasil já avançou muito nesse ponto – graças ao ensino, a exemplo de entidades como a Associação Brasileira de Sommeliers que tem dezenas de regionais em todo o país. Porém, como vocês mesmo verão, há muito a progredir ainda.

Difícil de engolir
Em um estabelecimento de bebidas de uma pequena cidade do Paraná, eis que me deparo com um espumante de grife pelo menos R$ 30 mais barato do que há dois anos. Se a inflação galgou entre 2023 e 2024, como pode a bebida ter ficado muito mais em conta? Para matar a charada, bastou checar o contrarrótulo. O produto não seguia as normas brasileiras, como trazer as informações em português. Somente constava o rótulo originário da Argentina. Ou seja, o espumante chegou até a cidade via descaminho – ou de outra forma também ilícita.

Portuguesa, com certeza?
O fato agora segue como destino o Paraná, mas dessa vez em uma cidade de médio porte, tida como a capital agrícola do oeste paranaense. Na adega, recém-inaugurada, pergunto para a atendente se eles vendem o Castas Portuguesas. Ela apenas aponta o dedo para a direita e diz: "Os vinhos de Portugal ficam naquela gôndola". Como é sabido, o Miolo Quinta do Seival Castas Portuguesas combina Touriga Nacional e Tinta Roriz, duas castas portuguesas, e é elaborado na unidade do Seival, em Candiota (RS).

Não vai
Isso ocorreu precisamente em 2013, durante o desfile das escolas de samba do grupo especial de São Paulo. Naquele ano, a Vai-Vai trouxe como samba-enredo o vinho, em uma iniciativa protagonizada pelo extinto Ibravin. Fazia parte da programação a distribuição de vinho que seria servido nas arquibancadas, como também vendido em caixinhas de 250 ml a baixo custo. Como uma das principais patrocinadoras do desfile paulista, uma importante marca de cerveja devassou a estratégia proibindo que o vinho fosse distribuído ou vendido para o público presente no Anhembi.

Um branco e um tinto
Esse caso ocorreu com o economista e sommelier Mauro Salvo. Autor de O consumidor de vinho no Brasil: Um olhar pela lente de um economista, comercializado pela Amazon, Salvo está coletando uma série de episódios parecidos para uma publicação futura. Reproduzo a seguir o acontecido escrito pela própria testemunha do fato, que também possui o perfil @economista_na_adega no Instagram. "Vou escrever um livro de contos sobre causos do mundo do vinho. Decidi isso hoje. Sentei no restaurante de um hotel em Santa Catarina. O garçom não trouxe a carta de vinhos. Pedi por ela. Analisei a carta que continha uns 30 rótulos. Quando pedi, o garçom me informou que tinha somente dois vinhos: um branco e um tinto. Pensei com meus três botões (eu estava vestindo uma camisa polo): ´Por que ele me trouxe a carta de vinhos se já sabia que só tinha dois?' Escolhi o branco. O vinho estava em temperatura ambiente (não tem adega climatizada, por óbvio). Ele trouxe um balde de gelo. Após a refeição, antes de eu ir embora, perguntei se eles cobrariam taxa de rolha, caso eu levasse o meu vinho. A resposta foi positiva, ao custo de R$ 80. O Brasil é um país inimigo do vinho".

Exato, Mauro. Por essa e por outras, o Brasil é um país inimigo do vinho.

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Sexta, 31 Janeiro 2025

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