Tão autêntico quanto possível
Semana passada comentei a restrição de algumas pessoas a respeito do turismo em Gramado. E citei que a principal delas é o município ter acumulado atrativos que mais emulam o artificialismo de cidades norte-americanas do que remetem às raízes locais (leia aqui). Por trás dessa discussão está o conceito de autenticidade, e, para abordá-lo, nada melhor do que contar com o auxílio de James Gilmore e Joseph Pine II, autores de livro com este nome (Campus, 2008; mini resumo aqui). Segundo eles, "[a]s pessoas cada vez mais avaliam o mundo em termos de real e falso, com base em suas próprias concepções do que é autêntico e do que não é" (p. 12). O motivo? A incapacidade de as principais instituições sociais – empresas privadas, estabelecimentos de ensino, governo, igreja e filantropia – provarem que seus propósitos e modus operandi são puros, sinceros. Daí a desconfiança generalizada nas pessoas e nas organizações e um clamor por mais veracidade na sociedade.
Acontece que, como dizem Gilmore & Pine II, cada um tem sua definição de originalidade. Ou seja, não se está tratando de "(...) verdades objetivas sobre um mundo objetivo", e sim de "realidades socialmente construídas" (p.21). E isso é especialmente importante quando se fala em turismo. Por quê? Ao viajar, geralmente buscamos uma experiência diferente daquela que temos na nossa cidade de residência, seja devido à realidade (natureza e/ou história), seja à fantasia (parques de diversão, resorts, cassinos etc.). No primeiro caso, "o ambiente que serve como estímulo para a experiência pode ser mais ou menos artificial, mais ou menos natural" (p.99). Repare: "mais ou menos" natural ou artificial, mas nunca totalmente um ou outro.
Daí que os autores comparam um respeitado destino turístico, a Holanda, com a vilipendiada Disneylândia, e afirmam: "a Holanda é tão completamente manufaturada quanto a Disneylândia! Não existe um único metro quadrado de terra no país que não tenha sido aterrado ou (...) transportado, modificado e tratado para parecer como se sempre estivesse estado lá" (p.100). Outro exemplo, tão insuspeito quanto o anterior: Veneza. Recorrendo ao excerto de outro autor, lembram que "nenhuma cidade estruturou sua posição de forma mais teatral, rigorosa, consistente e consciente" quanto a cidade flutuante (p.101). E fazem blague ao mencionar que já houve quem achasse a Veneza reproduzida em Las Vegas mais bonita que a original... Assim, remetendo à uma representação da colonização alemã ou criando atrativos meio descolados da realidade local, Gramado está apenas se comportando como qualquer destino turístico: comercializando o que foi produzido por mãos humanas, tanto quanto o Coliseu, a Torre Eiffel ou o Cristo Redentor. Se não tem a beleza nem a importância histórica de qualquer um desses símbolos, pouco importa: há gosto e bolso para tudo. E o tempo trata de tornar tradição o que é imitação, e clássico o que é novidade.
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Comentários: 1
Excelente! Concordo totalmente!