Upgrade de marca: a vez das Casas Bahia
"A felicidade/ é um crediário/ nas Casas Bahia!", cantavam os Mamonas Assassinas em meados dos anos 1990. Não havia lojas da varejista paulista no Sul, mas as campanhas publicitárias em rede nacional não deixavam dúvida: tratava-se de uma rede de forte apelo popular e tão presente no imaginário coletivo que conseguira fazer parte da letra de uma música.
Pois bem. Segundo a imprensa, as Casas Bahia, agora, querem também atender ao público de alta renda. Para isso, mudaram sua logomarca, investiram em uma nova campanha publicitária (vídeo ao fim do texto aqui) e pretendem, com o tempo, "dar um 'banho de loja' na experiência física, com a criação de lojas no 'estilo Apple'"(matéria completa aqui).
Lendo as matérias e assistindo ao vídeo da campanha, parece claro que não há uma tentativa de migrar de target, do popular para a alta renda, e sim de ampliá-lo, sinalizando às classes A e B que seus pontos de venda também podem ser destino daqueles que não se preocupam somente com preço e condições de pagamento. Mais ou menos como fizeram as Havaianas, quase 30 anos atrás, ao afastar o estigma de excessivamente popular ("Não deforma, não soltas as tiras e não tem cheiro") em nome de um palatável e atrativo conceito de universalidade ("Todo mundo usa").
Trata-se, assim, de uma tentativa de upgrade de marca, à semelhança daquela empreendida pelas próprias Havaianas e pela rede de vestuário Colcci (leia análise aqui). Como ambas foram bem-sucedidas, convém analisar as medidas das Casas Bahia à luz daquelas tomadas pelas duas marcas que enfrentaram desafio semelhante:
1) primeiro, foi necessário romper com o posicionamento anterior, predominantemente funcional;
2) depois, buscar fontes de legitimação externas para o novo posicionamento, mais simbólico; e, finalmente
3) pôde-se aproveitar o contexto cultural para propor o novo posicionamento.
Bem, me parece que as Casas Bahia pontuam bem nos itens 1 e 3, mas nem tanto no 2. Vejamos: o comercial destaca a satisfação da vida em família, e não preços ou condições de pagamento (1), e trata a universalidade não apenas como uma questão de classe social, mas também de raça, idade, sexualidade e inclusão (3). O que a empresa não faz é trazer figuras públicas para endossar esse novo posicionamento, quem sabe por considerá-las dispensáveis (2).
Temo, porém, que se o objetivo central é de fato atrair a alta renda, as medidas acima sejam tímidas. O comercial é uma ode à diversidade, recurso tão comum nos dias de hoje que, inevitavelmente, soa como clichê. Pouco para alguém quem pretende uma mudança de percepção mais acentuada. Por isso, imagino que a rede esteja deixando para o comércio eletrônico – e à publicidade on-line, com todas as suas especificidades – a tarefa de fisgar o consumidor de classe média.
O tal do ponto de venda "estilo Apple" pode ajudar nesse intento? Sim, certamente. Mas há que se cuidar na dosagem dessa transformação, para não correr o risco de intimidar e inibir o público-alvo tradicional. Mais praticidade e fluidez no atendimento são bem-vindos; sofisticação pura e simples, talvez não.
Por fim, um último registro. A controladora das Casas Bahia é proprietária da rede Ponto Frio, tradicionalmente posicionada para a classe média alta. A opção por tornar o target da primeira mais abrangente sugere que a segunda também será reposicionada – ou, quem sabe, colocada à venda caso o upgrade da coirmã se mostre bem-sucedido. Ou seja, talvez não sejam só os concorrentes que estejam de olho no reposicionamento das Casas Bahia – nem os únicos a torcerem contra a empreitada.
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