Exercícios físicos e Olimpíada

Não se deve atribuir as mazelas que nos acometem a nossos pais. Especialmente quando as intenções desses foram as melhores possíveis e estavam alinhadas com um pensamento vigente em determinada época ou até mesmo enraizado na crônica familiar. Inculp...
Exercícios físicos e Olimpíada

Não se deve atribuir as mazelas que nos acometem a nossos pais. Especialmente quando as intenções desses foram as melhores possíveis e estavam alinhadas com um pensamento vigente em determinada época ou até mesmo enraizado na crônica familiar. Inculpá-los é ainda mais grave quando tivemos tempo bastante para corrigir um mau passo e, por quaisquer razões, não procedemos à correção da rota. Por puro desleixo ou por razões que só poderíamos exumar com a ajuda da psicanálise. Se buscar orientação profissional permanece sempre uma opção aberta, também é certo que alguns problemas podem ter se tornado crônicos. E caberá ao indivíduo lidar com eles como pode ou quer. Mas sejamos concretos.  

Assim sendo, ao ver atletas suar a camisa, lembro a adolescência. Quando voltava das reuniões de pais e mestres, minha mãe me informava que papai se insurgira contra a carga de exercícios físicos que nos era infringida. Para ele, as partidas de futebol e as sessões de abdominais nada mais eram do que absoluta perda de tempo. Por que não mandar esses meninos ler um bom clássico russo ou reforçar as aulas de matemática, ao invés de desperdiçar tempo precioso com atividades que ele considerava naturais no fim de semana e olhe lá. Por que relegar a segundo plano horas de estudo em favor de atividades recreativas, dissociadas de um currículo do que considerava "gente séria"?  

Certo é que o tempo viria a consagrar que lugar de intelectual não era na praia, e sim no bar. Creio que foi alguém do Pasquim que disse isso, mesmo porque lá todos comungavam desse credo. Foi dessa forma, graças aos impulsos domésticos e externos, que resumi minhas atividades físicas a longas caminhadas, o que já é alguma coisa. E, na verdade, fui descuidando de tudo o que dissesse respeito aos cuidados com o corpo. Apesar de ser alto, é perceptível que acumulei bons trinta quilos além do que deveria. Se a idade já não conspira muito em favor de retomadas e o metabolismo do corpo se tornou preguiçoso, certo é que invejo as pessoas que conseguiram manter boa forma. 

Para agravar um pouco as coisas, meus pais temiam sobremodo a subnutrição. Não sei se é isso que Dr. Drauzio chama de "temores ancestrais". Mas insistiam para que comesse bastante, pouco antes de ir para a cama – ignorando o fato de que o sono também alimenta –, o que induziu o hábito de dormir pesado. É claro que a partir de dado momento, qualquer exercício passou a se revelar penoso, logo desestimulante. Ora, com o advento da asma e a importância que tomaram as atividades sedentárias nos dias de hoje, pois além dos livros e jornais temos a ditadura da internet, o fato é que vem sendo difícil quebrar essa inércia. Daí concluir o seguinte: quando comer passa a ser o grande programa, algo pode estar muito errado. 

Assim sendo, acho extremamente pertinente que se desenvolva ao máximo uma política pública tendo "fitness" e bem-estar físico como metas. Os hábitos da vida contemporânea conspiram imensamente para que se desenvolva todo tipo de obesidade mórbida e as consequências para a saúde tanto do indivíduo quanto para o atendimento ao público são perversas. Já se vê em aviões muita dificuldade de acomodação de passageiros nas poltronas e nos ônibus é comum que cada vez mais indivíduos se furtem das catracas e desçam pela porta por onde entraram, já que a circunferência da cintura não lhes permite a passagem. O que me causou perplexidade nos Estados Unidos décadas atrás é parte de nossa paisagem hoje.

A força dos preconceitos é avassaladora. No universo de papai, um homem nascido há quase 90 anos, a prática desportiva era tida como coisa de gente desocupada, desambiciosa e sem metas. É bem verdade que por uma questão de estilo, ele costumava louvar o iatismo ou o hipismo. Ou seja, esportes praticados por elites, portanto fora de nosso raio de alcance e interesse. Com isso, ele compunha um tipo e se protegia contra a pecha de detestar esportes. O que quer que seja, já foi. Que a Olimpíada possa trazer um novo alento aos brasileiros e que todos os esportes se desenvolvam por aqui. Acoimá-los de "coisa de desocupado" é, no mínimo, uma imperdoável ignorância. Esporte é vida. A festa de abertura já foi um belo começo.   

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Domingo, 15 Dezembro 2024

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