A sina de Khashoggi

Quando voltei a ouvir o sobrenome Khashoggi semana passada, nos corredores da Feira do Livro, de Frankfurt, de imediato pensei no saudita que ficou bilionário à custa de venda de armas. Adnan Khashoggi, falecido em Londres ano passado, era proprietár...
A sina de Khashoggi

Quando voltei a ouvir o sobrenome Khashoggi semana passada, nos corredores da Feira do Livro, de Frankfurt, de imediato pensei no saudita que ficou bilionário à custa de venda de armas. Adnan Khashoggi, falecido em Londres ano passado, era proprietário do luxuoso iate Nabila, nome da filha, e se aventurou pelo Brasil nos tempos do presidente Figueiredo, pelas mãos do empresário egípcio-libanês Nagi Nahas. Passados os anos, pouco ouvira falar dele e me perguntava porque seu nome voltara à baila. Foi só então que li na imprensa alemã que estávamos tratando aqui de um homônimo, este dito Jamal Khasoggi, jornalista do prestigioso Washington Post e visto com reservas pelas autoridades sauditas que, segundo todas as evidências, o eliminaram.

Jamal teria ido ao consulado (foto) para tramitar uma papelada relativa a seu casamento. Confiante de certa forma nas costas quentes junto a autoridades do Reino, teria cometido a imprudência de entrar com as próprias pernas na boca do leão. Pois ao que consta, naquele mesmo dia 2 de outubro último, uma equipe havia chegado da Arábia Saudita com a missão de serrar o corpo do jornalista nas dependências do consulado, forma efetiva de tirá-lo por partes de lá, para depois lhe dar o devido fim. Um relógio inteligente, conectado a um dispositivo então de posse de sua noiva, teria registrado os momentos derradeiros da agonia. Ainda sob investigação, o caso monstruoso já valeu à Arábia Saudita nítido distanciamento do mundo civilizado, até da Casa Branca, insuspeita de simpatias humanitárias.  

Assim sendo, nada menos do que os jornais New York Times e o Financial Times, além da revista The Economist, decidiram recuar da cobertura e apoio ao "Future Investment Initiative", que acontecerá no fim do mês em Riad, evento conhecido com a "Davos do Deserto". Políticas de investimentos também estão sendo revistas, a começar pelas do bilionário inglês Richard Branson. Quaisquer que sejam as explicações do todo poderoso Mohammed Bin Salman, esteja o monarca preparado para amargar punições com que não contava. Ao cometer o erro que, a médio prazo, poderá lhe ser fatal, Bin Salman poderá aquilatar em seu tempo de vida que nem sendo a Arábia Saudita a potência energética que é, o mundo será leniente com uma barbárie dessa sordidez e crueldade.  

Certo é que vivemos em constante mutação. Todos os dias, pessoas comuns e dirigentes supremos cometem faltas crassas e, mais cedo ou mais tarde, arcam com suas pesadas consequências. No Brasil, a luta contra a impunidade é uma constante. Por mais que seja peça de marketing político de péssimo gosto, o fato de um candidato a presidente alardear simpatias a um monstro de calabouço, um torturador assumido, é um despautério que mais adiante, poderá custar caro a nosso país, se ditas como piada de salão. Que o alerta fique vivo também para seu oponente, cujo partido foi responsável pela morte de dirigentes políticos refratários a seus proverbiais esquemas do mundo das sombras com o que, sob pretexto do bem público, só queria se locupletar e viciar a máquina do Estado. 

Para um para o outro, ganhe quem ganhar, nunca tivemos de ambos os lados do espectro prontuários tão bem adubados de iniquidades e talvez tão assemelhados em seus valores fundadores. Isso dito, antes de incendiarem suas turbas e lançarem seus asseclas ao assalto dos valores da democracia e dos ganhos da civilização, saibam que será o Brasil quem poderá pagar por tudo isso. E, pelo menos nesse quesito, estamos bem melhores do que a teocracia saudita. 

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Sábado, 14 Dezembro 2024

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