Mudança organizacional: quando iniciá-la?
Algumas perguntas que não querem calar: por que alguns processos de mudança organizacional são efetivos e outros não? O que diferencia os processos bem sucedidos de outros que acabam ficando pelo caminho? Quais fatores deveriam ser previamente avaliados antes de qualquer mudança?
Uma rápida análise da realidade de importantes organizações permite a identificação de vários processos de mudança que mais comprometeram o desempenho atual da organização do que a levaram para outro patamar de desempenho. Apesar de existir a convicção da necessidade de uma determinada mudança, nem sempre a mesma deveria ser iniciada imediatamente.
A correta avaliação da existência de um conjunto mínimo de conhecimentos e competências para sustentar todo o processo de mudança; do perfil e “coragem” dos líderes da mudança para desencadear todo o processo dentro da organização e do momento oportuno para a realização da mudança, são três variáveis que deveriam ser melhor analisadas antes de qualquer tipo de decisão.
Alguns pontos importantes em relação a cada uma dessas variáveis serão detalhados na sequência deste texto. A questão central que se coloca neste artigo é se a organização, apesar de possuir a convicção e clareza por uma determinada mudança, deveria ou não iniciá-la sem antes reunir toda a condição necessária para sustentar o alcance do resultado desejado.
Todo o conhecimento e as competências necessárias já estão disponíveis ou ao alcance da organização? Minimamente, antes de se iniciar qualquer processo, é necessário verificar se já existem os conhecimentos e as competências que permitirão a revisão do processo e do modelo mental das pessoas envolvidas. Para que essa avaliação possa ser realizada, é importante deixar claramente explicitado o “ponto de chegada” almejado. Obviamente, tudo o que está entre a situação atual e o ponto estabelecido no futuro requererá novos conhecimentos que serão transformados em novas competências individuais e organizacionais.
Vejamos, por exemplo, o caso de uma empresa que deseja instituir um processo de tomada de decisão e comunicação mais ágil e participativo, porém possui como ponto de saída uma estrutura organizacional fortemente hierarquizada e que valoriza demasiadamente as relações de poder. Fica evidente neste exemplo que estes dois mundos ou objetivos não conversam (ponto de saída X ponto de chegada).
Em qualquer caso se faz necessário um melhor entendimento do “como” essa transição ocorreria. Que competências seriam necessárias para que essa mudança pudesse acontecer, efetivamente? Esses conhecimentos e/ou competências de alguma forma existem junto aos indivíduos e à organização? Se a resposta for negativa, seria interessante verificar se a companhia possui recursos financeiros para buscar o apoio em pessoas e/ou organizações que já tenham trilhado caminhos semelhantes. Enfim, é muito importante que os líderes dessa mudança saibam dimensionar o tamanho do passo a ser dado para não comprometerem os resultados desejados.
Os líderes possuem o perfil adequado e a “coragem” necessária para liderar e sustentar todas as dificuldades inerentes à mudança?
As principais mudanças organizacionais não dependem somente de novos conhecimentos e do desenvolvimento de novas competências, mas também de pessoas que tenham “coragem” e estejam dispostas a liderar essa situação. A busca por líderes com uma atitude positiva e que se sintam encorajados a fazê-la, apesar de todas as dificuldades que possam surgir ao longo da caminhada, nem sempre é a parte mais fácil dessa equação.
Depois de iniciada, uma mudança organizacional deveria ir até o seu ponto de chegada sem ser interrompida, implementada de forma parcial ou mesmo de forma distorcida em função da “agenda organizacional” predominante. Entenda-se como “agenda organizacional” o conjunto de interesses internos pela manutenção do status quo.
O ponto que se coloca em debate neste caso é de como as “agendas individuais” que compõem a “agenda organizacional” serão trabalhadas. Como fazê-lo, se para isto precisamos questionar, inclusive, a nós mesmos e aos nossos pares e superiores? Nesse caso fica explícito que uma mudança organizacional de maior impacto, via de regra, não se limita apenas a entender as relações de poder existentes em uma organização, mas sim de dar conta das mais variadas “agendas” de interesses existentes.
Também não é incomum, dentro das organizações, depoimentos de executivos, os quais se dizem despreparados para lidar com uma determinada mudança organizacional, pois ela poderia impactar na manutenção de sua atual posição na organização bem como no seu relacionamento com pares, superiores e equipe. Nesse caso, é preferível que não se inicie o processo de mudança planejado até que se possa identificar e eleger um novo líder de projeto, que seja capaz de colocar a “agenda organizacional” à frente de qualquer outro tipo de “agenda”, inclusive a individual. Haja coragem e competência para isso!
As principais mudanças que culminam na entrega do resultado esperado são, em geral, patrocinadas pela alta gestão da organização e lideradas por pessoas que possuem coragem organizacional e que não temem, em nenhum momento, sacrificar a sua “agenda individual” em prol da “agenda organizacional”. Elas tampouco aceitam novos desafios sem estarem suficientemente seguras de que detém os conhecimentos e as competências para lidar com as mais diferentes etapas do processo.
Líderes com coragem e perfil adequado para liderar importantes processos de mudança, porém sem os conhecimentos e competências mínimos necessários, podem representar um grande risco à organização. Por outro lado, apenas um bom nível de conhecimentos e de competências, sem uma liderança adequada e uma boa dose de coragem de levá-la adiante, pode significar apenas uma boa intenção!
O momento é oportuno para iniciar?
Por fim, e não menos importante, está a definição do momento adequado para que a mudança ocorra. Qual a real necessidade de se iniciar a mudança nesse momento? Se não iniciarmos, o que acontecerá? Quais são os principais “motivadores”? Essas causas também se justificam no médio e longo prazo? De onde vem o “patrocínio” para que a mudança ocorra em tempo? Já existiram outras iniciativas similares? Se sim, por que elas foram bem sucedidas ou fracassaram?
Todos os questionamentos anteriores ajudam na melhor avaliação da relevância da mudança e se ela se sustentará até o ponto de chegada, por estar realmente conectada a um problema crítico da agenda organizacional. Essa é uma armadilha comum, pois de fato muitas das iniciativas são apenas motivadas pela agenda individual de seus líderes e não conversam com os propósitos maiores da agenda organizacional, tampouco objetivam melhorias do desempenho e da performance da organização.
Ainda que confirmada a relevância da mudança, cabe a pergunta se o momento de iniciá-la de fato chegou, pois assim como na vida pessoal, muitas vezes apesar da necessidade da mudança ser óbvia, a organização também precisa um tempo para entender e aceitar a importância da mesma para o seu crescimento ou, até mesmo, para a sua sobrevivência.
Não é sem razão que muitas das principais mudanças que ocorrem conosco e se tornam mais duradouras são frutos de um processo doloroso. A dor tem sido um dos principais motivadores de importantes mudanças pessoais. Problemas de saúde e a perda de familiares ou pessoas próximas nos ajudam a repensar a necessidade da mudança de alguns de nossos hábitos e comportamentos. No mundo organizacional isso não é muito diferente. A perda contínua de participação de mercado, rentabilidade, produtividade são alguns exemplos de “dor organizacional” que apoiam o desencadeamento de importantes transformações.
A decisão do momento de se iniciar uma mudança depende também da sensibilidade da organização (através do líder do projeto e do patrocinador do mesmo) de avaliar se os ganhos e benefícios da mudança serão maiores ou menores se a mesma iniciar de forma proativa ou reativa, considerando mais ou menos dor...
Portanto, uma melhor compreensão e avaliação dessa e das demais variáveis apontadas ao longo deste artigo facilitarão o processo decisório sobre o momento ideal de se iniciar, ou não, uma mudança organizacional já planejada. Todavia, o objetivo não é desestimular ou colocar entraves a nenhuma mudança na organização, mas apenas ajudar na reflexão sobre o momento mais adequado para iniciá-la. Num mundo onde mudar é essencial, nem sempre a melhor decisão é a de começar agora. Pense nisso!
*Gerente Executivo de Recursos Humanos da Randon S/A Implementos e Participações – Divisão Holding.
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