Você conhece a "Síndrome de Paris"?
1 – Vocês já ouviram falar de um psiquiatra japonês chamado Hiroaki Ota? Nem eu. Mas li que no seu consultório, há cerca de 20 anos, ele recebia viajantes japoneses que voltavam de Paris. E, contrariamente ao que se espera, o quadro dos pacientes nem sempre era bom.
2 – Pelo contrário. Antes de viajar, eles idealizavam o destino com todas as cores do paraíso. Chegando lá, Paris nem sempre correspondia às expectativas. Perdidos no meio do barulho enervante das sirenes de ambulância, bombeiros e polícia, a decepção era galopante.
3 – Os que chegavam lá achando que a cidade cheirava a croissant recém saído do forno, ficavam petrificados com os odores do Sena e a presença fortuita de ratazanas que passeavam pelos trilhos do metrô como se os humanos ali fossem um incômodo desprezível.
4 – Agrupados em pequenos núcleos, mesmo assim era comum que um patrício desgarrado fosse roubado e se reintegrasse ao grupo depenado da máquina fotográfica, do celular ou dos euros cuidadosamente guardados nos bolsos da japona impermeável.
5 – Em suma, Paris não era exatamente Paris. Onde estavam as cores sonhadas? O que não dizer de prestadores de serviço mal humorados que os atendiam como se estivessem fazendo um favor, bufando feito locomotiva? Como aceitar aquela falta de modos sem sofrer?
6 – O problema é tão agudo que a Embaixada do Japão em Paris tem até hoje uma linha 24 horas por dia para atender os nipônicos desesperados que não encontram ali uma fração das expectativas. Daí as náuseas, o vômito, a desorientação e a depressão que perdura.
7 – Hoje falei com uma amiga que estava em Paris bem à hora do happy hour. Será que eu sofri com a Síndrome de Paris quando cheguei lá pela primeira vez, há 52 anos? Um pouco, sim. Todo mundo vestia branco, preto, cinza ou azul-marinho. Estranhei.
8 – Achei Notre Dame decepcionante. O Sacré Coeur era de uma breguice assumida e me contentei em subir um par de vezes na Torre Eiffel – até hoje –, mesmo assim para as plataformas baixas, onde havia um bom restaurante. O Arco do Triunfo me pareceu desbotado.
9 – Mesmo assim, voltei para o Brasil louco para rever Paris. Alguma coisa na cidade me causava um frisson silente, um ardor de descoberta. Talvez, a exemplo dos japoneses, eu me atribuía uma parcela de culpa por não ter conseguido captar as belezas ocultas.
10 – Mas nada me fascinou tanto quanto ver as pessoas que comiam nas calçadas, bem à vontade, como se os passantes não existissem, sem se preocupar com os sentimentos que sua alegria iria suscitar nos demais. Aquilo significava que reinava um certo igualitarismo.
Setembro é um mês convidativo – aqui como lá – para nos sentarmos às mesas das calçadas. É raro o dia em que eu não me sente para ver a paisagem, tomar um café, um drink e respirar os ares da rua. É por essa e outras que Paris nunca sai totalmente de dentro de nós.
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