Manhattan Connection

É normal que muitos não gostem do programa por conta das cipoadas que Diogo Mainardi dá desde sempre em Lula e seu "entourage". Outros acham que o conteúdo é elitista e que o time não fala de pautas de alcance popular. Por fim, há aqueles que julgam ...
Manhattan Connection

É normal que muitos não gostem do programa por conta das cipoadas que Diogo Mainardi dá desde sempre em Lula e seu "entourage". Outros acham que o conteúdo é elitista e que o time não fala de pautas de alcance popular. Por fim, há aqueles que julgam o tom muito debochado, como se tudo pudesse ser objeto de escárnio. Seja como for, podem me incluir na relação dos teleouvintes que não pensam que qualquer das características acima seja desabonadora. Muito pelo contrário, acho que é da combinação dos três elementos que resulta uma emissão longeva e divertida. Por uma vez na vida, um programa em língua portuguesa consegue achar o tom exato dos que quebram a sisudez para falar de cultura e sabem resvalar um entretenimento de qualidade, ecoando o momento de uma cidade por muitos tida como a capital do mundo. 

Nesse contexto, gosto especialmente de Lucas Mendes. Trata-se do grande regente do time, da cepa daqueles jogadores geniais que sabiam o que fazer para que a equipe ganhasse consistência e fluísse em direção ao gol adversário. Poderia ser o equivalente a Gerson da seleção de 1970. Lucas é de longe o mais tarimbado e o detentor do maior repertório. Sem ser um devotado à filigrana intelectual, ao fim e ao cabo sempre se sai com uma visão surpreendentemente refinada dos temas em pauta, sem perder a leveza jamais. Ademais, tem o senso de "timing" para distribuir bem as falas e, se não fosse um virtuose, era possível que os egos já tivessem transbordado e avariado a boa alquimia que brota da tela. Concitando cada um a jogar para o time, ele faz o papel de "escada" como ninguém, levantando a bola na rede para que os colegas brilhem. Tem o melhor de Minas Gerais na cordialidade, mas bebeu do igualitarismo das redações dos Estados Unidos, onde refinou o ofício.  

Outro de quem gosto muito é Caio Blinder. Nos últimos anos, a maturidade limou a ansiedade e ele já não se sente obrigado a dar a última palavra em tudo. Curtindo um momento de cada vez, abraçou a boa tradição de quem não se leva muito a sério e, como bom judeu que é, se sai com tiradas bem humoradas, invariavelmente cândidas porque acompanhadas de um sorriso bonachão e genuíno. Como dizem os chineses, homens confiáveis riem com o estômago. O contraponto é o já aludido Diogo que, a exemplo dos italianos com quem vive o dia a dia, fala como se os fatos comentados fossem de obviedade ululante. De bem com a vida, percebe-se, contudo, um laivo de angústia que pode derivar do gosto exacerbado pela polêmica. Suas interferências são sempre boas, mas há de se separar da fala o fígado e a ira santa que parece movê-lo. 

De todos o que me parece mais convencional – talvez justamente por isso se encaixe muito bem no time – é o Ricardo Amorim, que fala de São Paulo. Certamente por viver cercado pelos seus clones de visual e domínio de competência, a figura dele tenha menos impacto sobre mim, conquanto seja um rapaz preparado e, ocasionalmente, muito bem humorado. Por fim, acho que se forma pouco a pouco uma unanimidade nacional, e internacional, em torno de Pedro Andrade que é dono de um estilo muito próprio, onde a faceta mundana casa bem com uma surpreendente cultura enciclopédica. Suas viagens ao redor do mundo mesclam muito bem "snapshots" culturais com o bom gosto inerente a quem se educou no coração trepidante de Manhattan e distritos. Até a inusitada participação de Angélica, a produtora, dá um toque final de simpatia ao programa. Nunca conheci nenhum deles. Só mesmo o falecido Paulo Francis. Mas essa história eu conto outro dia.

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Quarta, 11 Dezembro 2024

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