A China quer aprender português
Motivado por convite da professora Qiao Jianzhen (Ana Qiao), para palestra sobre a produção de alimentos no Brasil, para a sua turma de estudantes de português da Universidade Normal de Hebei, em Shijiazhuang (capital da província), renovei a curiosidade recorrente sobre a demanda chinesa pelo aprendizado da língua portuguesa e, ao pesquisar a respeito, descobri que o idioma segue firme após o espanhol, entre os de livre escolha (o inglês é obrigatório), à frente, portanto, do alemão e russo. Hebei, na região norte da China, é a província onde está localizada Beijing, a capital do país. Essa universidade conta com mais de 20 faculdades e um total de 58 mil alunos e alunas, entre graduação e pós-graduação.
Coincidentemente, hoje foi inaugurado na Universidade de Hebei o Centro de Pesquisa de Tradução em Comunicações Internacionais, com a participação de seus especialistas em várias línguas, entre elas a professora Ana Qiao, que tem grande experiência de Brasil, à frente do Instituto Confúcio na PUC-RIO desde 2012, e promovendo a criação da instituição em muitos outros estados. Foi graças ao empenho da professora Qiao, que o estado do Rio de Janeiro incluiu a língua chinesa no currículo oficial das escolas públicas (ensino médio intercultural), iniciando com o Colégio Estadual Matemático Joaquim Gomes de Sousa (em 2019, o mandarim entrou no currículo também na Escola Professor Fernando Duarte Rabelo, em Vitória, no Espírito Santo).
Pois bem, durante a pesquisa sobre a demanda chinesa pelo idioma luso, tropecei no incrível livro O Ensino de Português na China – parâmetros e perspectivas, organizado pela professora Yan Qiaorong, da Universidade de Comunicação da China (UCC, Beijing), e Fleide Daniel Albuquerque, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Disponível para download, o livro apresenta um panorama surpreendente sobre a difusão da língua portuguesa na China, desde os anos 1970.
Com departamento de português há dez anos, a Universidade de Linguagem e Cultura de Beijing (BLCU) é um dos destaques no ensino da língua. Há português também na universidade da linda cidade portuária de Dalian, província de Liaoning, desde 2008; e em Shanghai, Guangzhou e Macau – ex-colônia portuguesa (devolvida para a China em 1999), sempre muito atuante na difusão da língua e da cultura de Portugal.
O único senão para nós, em todo esse esforço chinês em aprender português, é que ele é hegemonizado pela versão de Portugal, e não do Brasil. Utilizei intérpretes em todas as minhas viagens dentro da China, por considerar importante contar com esse recurso, já que não se trata apenas da língua, mas também do conhecimento da cultura chinesa. Não foram poucas as vezes em que tive dificuldade para entender o intérprete de português, pelo sotaque carregado e pela lógica lusitana de raciocínio e de construção da frase, bem distinta da brasileira.
O Brasil tem 21 vezes a população de Portugal. Apesar disso, o Brasil não tem 10% do total de professores portugueses ensinando na China. Detalhe revelador da nossa debilidade na relação cultural com a China, nosso maior parceiro comercial desde 2009.
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