Para evitar um cemitério de empresas

Com um volume significativo de empresas ingressando compedidos de recuperação judicial será que não teremos uma bolha? Já que o termoestá na moda, com a bolha no mercado imobiliário, a bolha da internet e a bolhado Bitcoin, podemos pensar que num fut...

Com um volume significativo de empresas ingressando compedidos de recuperação judicial será que não teremos uma bolha? Já que o termoestá na moda, com a bolha no mercado imobiliário, a bolha da internet e a bolhado Bitcoin, podemos pensar que num futuro de 10 anos poderemos a vir a ter umabolha no mercado empresarial brasileiro? Quando dezenas ou centenas de empresasque ingressaram nos últimos anos com o pedido de recuperação judicial nãotiverem fôlego para cumprir os seus planos e pagar os credores teremos, narealidade, um grande cemitério de corporações vegetando por aí, sem sentido deexistir, e que resistem por muitos fatores, como o próprio orgulho de seusdonos, à liquidação forçada, leia-se falência. Para piorar, uma massa decréditos podres ficam circulando no mercado, fomentando a especulação e gerandomais prejuízo aos desavisados.

Essa previsão está alicerçada no fato de que a maioriadas empresas que buscam o benefício da recuperação judicial não possui um planominimamente estruturado sob a lógica econômico-financeira para suportar seuendividamento. Os pedidos de recuperação judicial são feitos às pressas quandoa companhia se vê já sem crédito, com baixo capital de giro e prestes a sofrerpedidos de falências e execuções forçadas. O instrumento que deveria serutilizado para se criar um real ambiente de diálogo e recuperação da empresa sedesvirtuou, para ser utilizado como medida de emergência e blindagem de caixa epatrimônio. Muitos credores – grandes empresas e instituições financeiras – jáse deram conta disso e estão mudando a postura nas assembleias de credores.Aprovar planos de 15 a 20 anos, com grandes carências e descontos não está maissendo fácil. A farra acabou. O mercado se deu conta que o ambiente no Brasil –não só pela crise, mas também pela própria cultura – não possibilita novaslinhas de crédito a empresas em recuperação judicial, que passam a sofrer aindamais para sobreviver. Credores já se deram conta que não vão receber seuscréditos e que a recuperação judicial, nesse caso, é um emaranhado burocráticoque – sem a melhora do ambiente de mercado – não levará a empresa a lugarnenhum. Sempre há as exceções.

Empresas com bons produtos e serviços, canais dedistribuição estruturados, estrutura física razoável, capital humano eintelectual podem, mesmo em recuperação judicial, chamar a atenção de fundos deinvestimento e investidores sinérgicos. Mas isso é a exceção, não a regra. Numpaís que não sabe quando e onde acabará essa crise, companhias que ingressaramhá poucos anos com suas recuperações judiciais estão finalizando seus períodosde carência e necessitam iniciar o pagamento de suas dívidas, o que não vemocorrendo. Como resultado, aditivos ao plano e novas adaptações, com proposiçãode dilatação de prazos, mais carências, etc estão sendo feitos. Todos tem aesperança de que a empresa vai melhorar. Todos fingem que acreditam nisso!Enganam-se a empresa, o juízo e os credores! Ninguém quer a falência, a morteestruturada, que muitas vezes vende ativos e paga realmente os credores, pararoda girar. Preferimos as empresas-zumbis que por anos, vão gerar mais despesasque receitas até efetivamente adormecerem no passado depois de 20, 30 anos.Esperança aqui gera um desvirtuamento e uma negação da realidade!

Defendo o processo de recuperação judicial, uma leimoderna que possui muitos benefícios, mas desde que haja estrutura efundamentos reais para a empresa voltar a ter saúde. Esse instrumento legalvirou um produto vendido como solução para todos os males. Se ajuda a blindar opassado, o que dizer do futuro? Uma companhia que já apresenta sinais dedificuldades e perda de competitividade há mais de cinco anos, com problemasestruturais sérios, não tem na recuperação judicial a solução de seus problemassem um choque de gestão interna e reposicionamento efetivo no mercado.  Não haverá crédito para ela! A desconfiançasó aumenta e para piorar o parco faturamento futuro já foi negociado com omercado financeiro em geral.

A assertiva de que a recuperação judicial protege e geracaixa é no mínimo duvidosa para não dizer falsa na maioria das vezes. Asuspensão das ações judiciais por 180 dias dá um folego, mas não traz solução.Créditos extraconcursais e dívidas fiscais continuam correndo normalmente. Esobre esse item – dívidas fiscais – existe outra realidade cinzenta! Como elasnão estão abarcadas na recuperação judicial, as empresas em dificuldadesimplesmente as deixam de lado. Afinal não há dinheiro nem para folha depagamento e matéria-prima, quanto mais para o fisco. Há companhias que alegamestar em melhor situação momentânea com a concessão da recuperação judicial,por desconsiderar por completo as dívidas fiscais que não param de se avolumarsem solução. Elas praticamente não existem, até que venha um novo plano de parcelamentoque será cumprido parcialmente numa roda sem fim.

 Somente com uma análise crítica e adaptações da lei derecuperação judicial à realidade de mercado, com fomento ao crédito às empresassérias, mas em dificuldade, sem perda das premissas e garantias que o mercadonaturalmente exige; somente com instrumentos punitivos a simulações e fraudes esomente através da elaboração de planos com fundamentos econômicos efinanceiros é que teremos a real participação dos credores neste processo eevitaremos no futuro um cemitério de empresas.

*Presidente da Comissão de Falências e RecuperaçãoJudicial da OAB/RS.

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Quinta, 12 Dezembro 2024

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