Não há decisão fácil
Não adianta. Os cientistas do clima falam, gesticulam, gritam e se descabelam, mas, como dizia o escritor Carlos Heitor Cony (1926-2018), "ninguém toma providências". Entrevistados pela Folha de S. Paulo em meados deste ano (02 junho 2024), vários desses especialistas revelaram frustração por verem seus alertas ignorados – ou, na melhor das hipóteses, ouvidos, mas pouco transformados em ações concretas contra o aquecimento global. Na esteira de mais uma COP que termina com resultados modestos, a pergunta é inevitável: por que a palavra de técnicos tem papel limitado na tomada de decisão, seja ela de países ou de empresas?
A resposta é a mesma para ambos: porque dificilmente um problema é apenas técnico. Os impactos da conversão da atual sociedade industrial em outra, baseada em combustíveis não poluentes, são de natureza econômica, infraestrutural, diplomática, geográfica, política, humana – e daí segue uma longa lista de etecéteras. Multiplique essa complexidade por 200 nações e o resultado é este que acompanhamos a cada Conferência do Clima: acordos e promessas de longo prazo descumpridos à risca.
Embora em escala infinitamente menor, nas organizações a coisa é parecida. Questões exclusivamente técnicas costumam ser resolvidas pelos especialistas e nem chegam à mesa dos executivos. Estes estão lá justamente para arbitrar temas que envolvam contradições intersetoriais, impactos diversos e exigências conflitantes, e dos quais o aspecto técnico é apenas um dos componentes.
Para complicar, costuma-se entender que, nas empresas, a decisão técnica, ao menos no C-level, é sinônimo daquela baseada em dados, em evidências. Não se trata de uma definição equivocada, claro. Mas há que se lembrar que nem sempre os números falam por si; geralmente, demandam interpretação. E, mesmo que cristalinos, apontando numa direção, a capacidade de ponderar consequências variadas ainda é uma faculdade bastante humana.
Assim, por mais decepcionante que pareça a tantos pesquisadores que têm se dedicado ao futuro da Terra, fica difícil imaginar que a agenda climática avançaria de maneira linear, sem um ir e vir exasperante.
Conhecido pela bagagem humanista, Celso Furtado costumava dizer que nunca se deparara com um problema econômico que fosse exclusivamente econômico. Com a emergência climática não é diferente; não é nem nunca será apenas climática, a despeito de quão séria e assustadora.
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