Minha crise dos outros

E quando negócios são atingidos por estilhaços alheios?

Manuais para lidar com crises de imagem existem aos montes, e não mudam muito em matéria de recomendações: seja transparente, comunique-se interna e externamente, defina um único porta-voz e só se manifeste quando houver certeza. Não lembro de nenhum, contudo, que fale como agir quando a empresa não é a causadora direta dos apuros que enfrenta, e sim vítima involuntária da má reputação de terceiros.

É o problemão que bares e restaurantes têm enfrentado desde a semana passada, quando foram divulgados os primeiros casos de contaminação de destilados por metanol. Enquanto apontam o dedo para concorrentes inescrupulosos, que teriam comprado a bebida de fontes inconfiáveis, têm de se esmerar em convencer a clientela de que tudo o que é servido em seus ambientes vem direto da indústria ou de distribuidores credenciados, sob rígido protocolo de segurança. E que uma vez aberta uma garrafa pelo barman, nenhum espertinho (ou psicopata) vai injetar qualquer coisa lá dentro, seja para "fazer render" as próximas doses, seja para intoxicar o bebedor.

A conclusão das investigações será fundamental para determinar a direção dos esforços e, principalmente, sua eficácia. Se descoberto um esquema de falsificação e/ou adulteração, tanto melhor (ou, vá lá, menos ruim). Basta reforçar a imagem de estabelecimento responsável criando um selo de parceiro oficial das fabricantes, por exemplo, e espalhá-lo por onde os olhos alcançarem: fachada, cardápio, paredes internas, uniformes etc. E se alguém mais desconfiado quiser tirar a prova dos nove, sempre haverá um comerciante disposto a exibir as notas fiscais com a procedência garantida.

Porém, se a conclusão for de que houve falhas na manufatura, como também se aventou, todo o setor de bebidas entrará em descrédito, ao menos naquelas categorias em que já foram identificadas contaminações (vinhos e cerveja, por enquanto, estão a salvo). A Vigilância Sanitária possivelmente vá exigir o recolhimento das mercadorias que estão nas gôndolas e prateleiras, isso se comerciantes não o fizerem por conta própria, ante a queda na demanda e os riscos de mantê-las à disposição.

Um motivo adicional torna a identificação da origem da adulteração fundamental para estimar a duração da crise. Estamos às portas do verão e de suas festas de fim de ano, férias e altas temperaturas, tudo o que conspira para o aumento do consumo de álcool. Se a culpa recair em atravessadores ou crime organizado, a sazonalidade jogará a favor da recuperação, provavelmente apoiada em uma mobilização publicitária que reunirá indústria, distribuição e varejo.

Mas se a gênese estiver nas fábricas, ou mesmo se restar qualquer traço de desconfiança a esse respeito, uma debacle sistêmica estará desde já contratada.

E a solução para embaraços dessas proporções, impactantes e longevos, manual nenhum costuma mencionar, pois não depende de ferramentas de marketing ou comunicação: é deixar o tempo passar e o esquecimento agir.

E matar no peito os prejuízos, claro.

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Segunda, 06 Outubro 2025

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