Dificuldade em ver os erros
Sim, temos dificuldade em enxergar os nossos erros - e esse é o primeiro passo para encaminhar as soluções adequadas. Prova disso é que saímos de uma década de crescimento fácil, graças ao boom das commodities, e empacamos tão logo os preços baixaram. E não adianta atribuir a culpa ao mercado internacional. Deveríamos ter nos preparado para os momentos de vacas magras que certamente viriam a exemplo de outros países que, enfrentando os mesmos problemas, continuam crescendo a taxas robustas ou estão se preparando para isso. Além dos sempre mencionados China e Índia, temos a Indonésia, que só no ano passado cresceu 5,5%. E ainda nossos vizinhos Chile, Peru, Colômbia e o México, que vem trabalhando num pacote de reformas estruturantes para elevar a produtividade e reduzir a pobreza. Isso fará com que a economia mexicana cresça a uma taxa de 5% ao ano pelas próximas duas décadas.
John Micklethwait, diretor-geral da Bloomberg News, e Adrian Wooldridge, editor da The Economist, publicaram recentemente o livro A Quarta Revolução – A Corrida Global para Reinventar o Estado. Na obra, eles analisam bons e maus exemplos de atuações de governos. Como Lee Kuan Yew, que em três décadas transformou Singapura na Suíça da Ásia. Lee é um crítico dos excessos do Ocidente, da democracia irrestrita a políticas de bem estar social, que ele compara a um bufê liberado onde concessões que deveriam servir aos pobres, como universidade gratuita, são estendidas às camadas mais abastadas. “Os políticos hoje são como arquitetos que discutem as condições dos cômodos numa casa em ruínas, apressando-se em consertar uma janela aqui outra acolá, sem jamais considerar as condições da edificação. Precisamos refletir em profundidade sobre a função adequada do Estado”, afirmam os autores Micklethwait e Wooldridge.
Desde 2005, o Banco Mundial vem analisando as reformas implementadas por 189 países para melhorar o ambiente de negócios. O Brasil está na 75ª posição. Após 37 reformas para melhorar a competitividade, um pequeno país chamado Geórgia alcançou o topo do ranking. Augusto de La Torre, economista-chefe do banco para a América Latina, questiona “se a dinâmica social do Brasil vai resultar em apoio a um projeto de reformas igualmente significativas... A única forma de continuar incluindo os mais pobres é reformar a economia para destravar o crescimento”.
Um importante fator a restringir o crescimento brasileiro é a falta de poupança, que limita a capacidade de investimento do país. E estimular o consumo como temos feito, sem a ampliação da oferta, seja de infraestrutura, tecnologia ou capacidade produtiva, pressiona a inflação.
Em 2010, a taxa de poupança privada no Brasil foi de 18,5% do PIB e a pública foi negativa em 0,5%. Além de estimular em excesso o consumo, o Estado ainda compromete a já baixa poupança privada. Em 2013, com o aumento da carga tributária, o setor privado não conseguiu poupar mais do que 17,2%, dos quais 2,8% foram consumidos pelo aumento dos gastos públicos, reduzindo a taxa líquida do país a menos de 15%. Segundo Bernard Appy, da Consultoria CCA, a criação de incentivos à poupança é essencial para nos livrarmos da armadilha de baixo crescimento. Mas o exemplo deve vir do próprio poder público.
O Brasil tem buscado recursos externos para suprir a falta de poupança interna, mas como na gestão financeira de famílias e empresas, existe um limite prudencial para isso. Não faz tanto tempo assim que passamos por maus momentos por excesso de dívida externa. A correlação entre taxa de poupança e capacidade de investimento fica clara quando comparamos a taxa média do período entre 2010 e 2013 de diferentes países. Nos desenvolvidos, a relação é de 20% de poupança para 20% de investimento; na América Latina, 21% e 23,5%; a média mundial é de 25% e 24%; em países em desenvolvimento, 33% e 32%; e, nas nações asiáticas em desenvolvimento, 44% e 43%.
Já no Brasil, a relação entre taxa de poupança e investimento gira em torno de 16% e 19%. Certamente, um sistema previdenciário excessivamente generoso é fator importante para desestimular a nossa poupança. Ao contrário da China, onde a precariedade da seguridade social leva a poupança a 52% do PIB (a registrar também o bom exemplo que o governo chinês dá ao poupar 11% do PIB). Mas nem tanto ao céu, nem tanto a terra.
Devemos nos inspirar em países democráticos que tomaram medidas importantes para restringir os gastos sociais, visando aumentar a taxa de poupança. Ainda mais se considerarmos as mudanças demográficas em curso no país. As recentes mudanças propostas no seguro desemprego, abono salarial e pensão por morte caminham nessa direção.
A alta carga tributária, que subtrai a poupança, tem sido um dos freios ao crescimento brasileiro. Ela aumentou de 27% do PIB, em 1995, para os 37% atuais. E pior: na época, o governo conseguia investir 5% e hoje não consegue mais de 2,5%, somados União, estados e municípios. Investíamos 25% do PIB, hoje apenas 17%. Por outro lado, o Chile, onde os impostos não passam de 20% do PIB, consegue investir 25%. E a China, com uma carga tributária de 17%, investe quase 50%.
No Brasil, o poder público, mesmo arrecadando muito, consome ainda parte da poupança feita pela sociedade – e mesmo assim investe pouco. O motivo é o constante e acelerado crescimento dos gastos correntes, que já ultrapassaram 40% do PIB. Por opção e por ineficiência, anulamos a nossa capacidade de crescimento. Muito mais nobre é o gestor público que colhe seus momentos de impopularidade por tomar medidas duras para um futuro sustentável, como as reformas estruturais, do que aquele que colhe o mesmo resultado por omissão ou escolhas erradas. Contudo, ainda é melhor mudar de lado agora, tardiamente, do que não fazê-lo.
*Empresário e coordenador do Movimento Brasil Eficiente (MBE).
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