Tocando em frente

Dias antes da votação da admissibilidade do pedido de impeachment pela Câmara dos Deputados, em 2016, a então presidente Dilma Rousseff concedeu entrevista coletiva na qual, entre outros assuntos, abordou o tamanho do Estado e seu grau de intervenção...
Tocando em frente

Dias antes da votação da admissibilidade do pedido de impeachment pela Câmara dos Deputados, em 2016, a então presidente Dilma Rousseff concedeu entrevista coletiva na qual, entre outros assuntos, abordou o tamanho do Estado e seu grau de intervenção na economia e nos serviços essenciais. “É uma visão primária haver, no Brasil, [a proposição] de [um] Estado mínimo. Estado mínimo é compatível com países desenvolvidos, e mesmo assim alguns não fazem isso”, disse ela na ocasião. Não se pode acusá-la de incoerência: em 13 anos de governo federal do PT foram criadas quase tantas estatais quanto nos 21 anos de ditadura militar, segundo levantamento do Instituto Teotônio Vilela, ligado ao PSDB. Diante dos números, no entanto, fica difícil não acreditar que o gigantismo e a ineficiência estatais sejam um dos fatores a travar o desenvolvimento brasileiro. Evitar ampliá-los, pois, seria uma prudência recomendável a qualquer mandatário daqui em diante. Mas, para além dessa aparente obviedade, o que mais pode-se propor ao país?

A inclinação atual do pensamento à direita é apoiar a delegação de determinados serviços à iniciativa privada e garantir sua supervisão por agências reguladoras estatais. Parece bastante razoável, assim como o tão defendido “choque de gestão” no serviço público, a partir do transplante de boas práticas gerenciais do mundo corporativo para repartições Brasil afora. Um caminho do meio entre o ultraliberalismo que nação alguma adotou, nem mesmo os Estados Unidos, e a intervenção excessiva dos anos petistas.

Convenientes na teoria, tais alternativas ainda estão por oferecer comprovações práticas de sua eficácia. Lembremos o recente desastre ambiental de Mariana (MG), no qual iniciativa privada e poder público praticamente consorciaram-se em uma negligência criminosa, ou a histórica inaptidão de nossos órgãos de fiscalização, como Anatel, Anac e Banco Central. Parece que todos sofrem da mesma síndrome de “captura” que seus equivalentes em outros lugares do mundo, servindo mais aos interesses empresariais que aos dos cidadãos. 

Já a transformação do serviço público por ferramentas gerenciais consagradas na iniciativa privada parece, novamente, outro belo avanço. Porém, a meritocracia defendida no ensino público, para citar um exemplo recorrente, não proveu resultados educacionais muito melhores do que o formato tradicional de remuneração de professores e diretores escolares nos Estados Unidos, como mostra Diane Ravitch em Vida e Morte do Grande Sistema Escolar Americano (ed. Sulina, 2011). Seria diferente por aqui?

Desconhecemos. Certeza, apenas, a de que não há saída fácil. Para a urgência de nossas demandas, a democracia parece por demais trabalhosa, demorada e cansativa; a busca de soluções num processo de tentativa e erro, em ciclos de quatro anos mediados pela política, soa exageradamente estanque e formal. Não por acaso, Mario Henrique Simonsen dizia que o melhor dirigente é o déspota esclarecido. Mas o próprio Simonsen, ministro nos anos militares, se apressaria em acrescentar que “a democracia é o melhor seguro contra o mau ditador” – e é com ela que teremos de seguir em frente.

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Quinta, 12 Dezembro 2024

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