Todos precisam ceder algo para viabilizar uma reforma tributária

Em entrevista ao Portal AMANHÃ, o governador gaúcho Eduardo Leite afirma estar preocupado com as constantes interrupções dos debates envolvendo o tema
Para Leite, o Rio Grande do Sul criou um “modelo inédito de enfrentamento ao coronavírus no país”, o Distanciamento Controlado, que equilibraria os objetivos de proteção da saúde e preservação da economia

Ao fazer um balanço de seus dois anos de mandato, o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, enumerou o que aponta ser conquistas de sua gestão e não quis abordar insucessos. "Prefiro focar na parte positiva", alegou. centrando suas análises nas medidas de ajuste fiscal e principalmente na reforma da previdência dos servidores públicos estaduais, através da "Reforma RS" – cujo impacto é estimado em R$ 18,7 bilhões ao longo dos próximos 10 anos. "Em 2020, pela primeira vez nos últimos dez anos, reduzimos a despesa com pessoal e foi possível diminuir em R$ 1 bilhão o déficit previdenciário, fruto da reforma", afirma Leite. Confira, a seguir, a entrevista na íntegra.

Qual foi a ação de melhor resultado que sua gestão teve no enfrentamento ao novo coronavírus no Rio Grande do Sul?
O Rio Grande do Sul criou um modelo inédito de enfrentamento ao coronavírus no país, o Distanciamento Controlado, sendo que depois passou a ter iniciativas semelhantes em vários Estados. Esse modelo foi implementado ainda em maio, com o objetivo de conciliar a proteção à saúde com a preservação da economia. Criamos protocolos com nível de restrição de acordo com indicadores de propagação da doença e da capacidade de atendimento de saúde em cada região. Assim, foi possível aplicar as restrições no momento, no local e na proporção adequados. Antes mesmo de vigorar o Distanciamento Controlado, iniciamos um amplo processo de ampliação das UTIs SUS. Antes da pandemia, o estado tinha 933 leitos UTI SUS. Hoje, já temos mais de 2 mil leitos desse tipo, um aumento de cerca de 115% na capacidade de atendimento. É mais do que o Rio Grande do Sul criou em toda sua história. E o mais importante: com essa ampliação, alcançada também com o apoio do governo federal, o Estado garantiu que ninguém ficasse desassistido em termos de atendimento médico. Um modelo inédito, que permitiu ao Rio Grande do Sul estar entre os Estados com menor número de casos e óbitos, além de estar entre os que conseguiram manter por maior tempo as atividades econômicas funcionando. O Rio Grande do Sul é o Estado que teve o menor excesso de óbitos do país desde início da pandemia, cerca de 3%, enquanto alguns Estados apresentam alta de mais de 50%. A pandemia de coronavírus, que infelizmente ainda não terminou, nos traz muitos ensinamentos, tanto em relação à importância de garantir serviços de qualidade na saúde quanto aos cuidados de higiene e prevenção que a população precisa manter sempre. Mesmo com o processo de imunização iniciando é fundamental que as pessoas mantenham os cuidados, como o distanciamento, o uso da máscara e de álcool em gel. Afinal, até todos receberem a vacina, ainda vai levar tempo.

Qual a lacuna que fica para sua gestão ou para a próxima, visando precaver o Estado de uma nova pandemia?
Acredito que um dos grandes desafios para preparar o Estado para situações semelhantes, que esperamos que não aconteçam nunca mais, será, no nosso caso, o de seguir na busca pelo equilíbrio fiscal, de forma a manter a capacidade de prestar serviços, como os de saúde pública. Somente com as contas em dia é que teremos capacidade de investir e dar melhor qualidade de vida à população. Na nossa gestão, além de manter sempre em dia os pagamentos na saúde a municípios e hospitais, quitamos contas atrasadas de gestões anteriores. A garantia desses recursos foi de enorme importância nesse processo. Trabalhar com transparência e insistir na implantação de ações com embasamento científico também deixam o legado de confiança para situações semelhantes.

Quais ações o Piratini está tomando de modo a equilibrar a balança entre a economia e a saúde?
O modelo do Distanciamento Controlado busca exatamente garantir esse equilíbrio, sempre com prioridade à vida, sem deixar de lado a economia. Em relação especificamente à questão econômica, embora a pandemia tenha tido impacto negativo, o Estado já vinha enfrentando dificuldades financeiras. Um dos exemplos mais claros é o fato de termos ficado 57 meses sem conseguir pagar os servidores públicos em dia. Em novembro e dezembro de 2020, regularizamos os pagamentos depois de quase cinco anos. Isso foi possível em virtude das diversas ações focadas na redução do custo da máquina pública e para gerar competitividade no Estado. A principal ação, até o momento, foi a Reforma RS, conjunto de medidas que representou a mais profunda mudança na previdência e nas carreiras dos servidores gaúchos de todos os Poderes da história recente. As propostas que compuseram a Reforma RS englobam a contenção do avanço das despesas de pessoal, a reforma do sistema previdenciário e a modernização da legislação de recursos humanos do Estado.

Qual é a economia que o Estado fará por causa dessas iniciativas visando diminuir o tamanho da máquina pública?
O impacto do Reforma RS é estimado em R$ 18,7 bilhões ao longo dos próximos 10 anos. Em 2020, pela primeira vez nos últimos dez anos, reduzimos a despesa com pessoal e foi possível diminuir em R$ 1 bilhão o déficit previdenciário, fruto da reforma, uma das nossas ações para reduzir o custo da máquina pública. Por causa das reformas e medidas aprovadas na Assembleia, por exemplo, conseguimos cumprir o cronograma de chamamento de agentes da Secretaria de Segurança Pública e, ao longo de 2020, formamos 1.367 novos agentes, entre delegados, soldados, peritos e outros. E, até o final de 2022, vamos viabilizar o chamamento de mais 3,2 mil novos servidores para a segurança pública. O Estado também está dando encaminhamento a processos de concessões, parcerias público-privadas e privatizações, com intenção de enxugar a máquina pública e gerar mais oportunidade de emprego e renda, com participação da iniciativa privada. Um exemplo recente foi o leilão de concessão da RSC-287, rodovia que corta o Estado de leste a oeste da Grande Porto Alegre até a região Central. O consórcio Via Central venceu a disputa ao apresentar a menor proposta de tarifa de pedágio com tarifa 54,4% abaixo do teto estipulado na licitação. Ainda vamos conceder à iniciativa privada e garantir investimentos em mais 1.151 quilômetros de estradas gaúchas (18 rodovias ao todo). Além de tornar o Rio Grande do Sul um Estado que honre seus compromissos, trabalhamos intensamente para retomar a capacidade de investimento e garantir melhores condições para se viver e investir aqui, com mais qualidade de vida.

Que setores econômicos ainda estão mais vulneráveis, após o longo período de quarentena? Como estimulá-los? Há espaço fiscal para ações nesse sentido?
Antes de mais nada, vale lembrar que a indústria praticamente não parou suas atividades durante a pandemia. Vejo pessoas dizendo que paramos a economia, o que não é verdade. Mas poucos foram os setores não afetados pela crise. De fato, alguns demandam maior atenção. Durante os piores meses da pandemia, buscamos manter a prestação dos serviços na saúde e na segurança com todas as medidas que estavam ao alcance do Estado para reduzir o impacto sobre os setores. A recuperação poderá ser mais lenta para o turismo, transporte, entretenimento, cultura e educação, por exemplo. Dessa forma, entre outras medidas, aprovamos ações para estimular a economia por conta da pandemia envolvendo programas como o Fundopem RS, o Pronampe, e o Fungetur, que garante crédito para empresas do ramo do turismo via Badesul. Outro programa é o RS Trabalho, Emprego e Renda – RS TER, com foco na geração de trabalho, emprego e renda por meio do fomento ao empreendedorismo e criação ou sustentabilidade de negócios embrionários, MEIs, micro e pequenas empresas. E, mais recentemente, lançamos, em parceria com o BRDE, uma linha especial de financiamento para empresas da economia criativa gaúcha, que geram cerca de 130 mil empregos formais. Significa mais crédito, com taxa de juro entre as mais baixas do mercado, para um dos setores mais atingidos pelas restrições da Covid e possibilidade de oferta para investimento no pós-pandemia. Ou seja, são muitas as ações em frentes variadas já adotadas pelo governo para auxiliar os diferentes setores a enfrentar as restrições impostas pela Covid-19 e promover a recuperação da atividade econômica no Rio Grande do Sul. Ainda assim, elas não se esgotam aqui. Seguiremos dialogando e construindo soluções para melhorar a vida de todos os gaúchos. Cabe destacar ainda que o Rio Grande do Sul reduziu a carga tributária em plena pandemia. Estamos eliminando o Imposto de fronteira e apoiamos diversos setores, como, por exemplo, a aviação regional. E fizemos isso de forma responsável, não apenas reduzindo impostos por reduzir, mas de forma inteligente e coerente para continuarmos tendo os recursos necessários para atender a população e prestar serviços públicos essenciais, especialmente na saúde, mas também na segurança, na educação e nas demais áreas geridas pelo Estado. Nesse sentido, seguiremos firmes no nosso objetivo de ajuste das contas sem deixar de tomarmos as medidas necessários para promover a economia, o desenvolvimento e a competitividade.

Onde falha e onde acerta o debate entre governo e parlamento em torno da reforma tributária nacional? Qual medida se mostra mais necessária, ou qual lhe preocupa mais?
O que mais nos preocupa é o tempo para a discussão e implementação de uma reforma nacional, já que há anos esse debate é interrompido. O maior consenso entre Estados, Congresso e governo federal é sobre a necessidade de uma reforma tributária. Numa reforma, todos precisam estar dispostos a ceder em alguns pontos para o benefício de todos. Talvez esse ajuste entre os interesses de todas as partes ainda seja um ponto a ser superado. Até o momento, o governo federal encaminhou a revisão do PIS COFINS. Embora contenha conceitos de modernização próximos a um Imposto sobre Valor Agregado (IVA), entendemos que esse projeto precisa ser consolidado com outros tributos sobre o consumo (ICMS e ISS), além de ser oportuno conhecer todas as propostas que a União tem para os demais impostos sob sua regulação, como o de renda para pessoas físicas e jurídica. Nosso governo e as áreas técnicas reconhecem a necessidade de um modelo menos complexo. A Secretaria da Fazenda, inclusive, participa ativamente do fórum dos secretários de Fazenda de todo o país que elaborou uma proposta conjunta para a reforma tributária, o que demonstra a pertinência e prioridade de tema. O Rio Grande do Sul tem sido ativo nos debates relativos à PEC 45, apoiando a criação de um IVA, em substituição ao ICMS, PIS, Cofins, IPI e ISS, observando os atuais patamares de receita e um grau de autonomia dos Estados na gestão do tributo.

Como o senhor avalia os dois anos de mandato? Qual foi a maior conquista e a maior derrota da sua gestão nesse período?
Trabalhamos intensamente em busca do equilíbrio fiscal, para que o Estado possa pagar suas contas, honrar compromissos, retomar o poder de investimento e, a partir disso, gerar mais desenvolvimento, emprego, segurança e qualidade de vida com serviços públicos eficientes. Creio que avançamos nessa pauta. Tivemos conquistas importantes, como a aprovação das reformas estruturais mais profundas das últimas décadas, conseguimos pagar o salário dos servidores em dia nos últimos dois meses, depois de 57 meses de atraso, e um excelente resultado no primeiro leilão para concessão de rodovias. Prefiro focar na parte positiva, pois tudo que é feito é feito com esse foco. Fizemos muito e iremos ampliar as realizações na segunda metade do mandato.

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Sexta, 29 Março 2024

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