Transferência de tecnologia entra na alça de mira da Taurus
A Taurus subiu um degrau em seu plano de negócios ao anunciar a joint venture com o grupo indiano Jindal. A companhia, que completou 80 anos em 2019, passa de fabricante e vendedora de armas a um novo patamar, credenciando-se a partir de agora como exportadora de tecnologia para esses equipamentos. "Não se trata, apenas, de montar uma fábrica na Índia. Temos de transferir tecnologia para essa unidade, pois o governo daquele país não abre mão de ter para si o know-how – e a maioria dos governos quer ter sua indústria de defesa", explica Salésio Nuhs, presidente da empresa que, no Sul, tem fábrica em São Leopoldo (RS).
O Jindal Group, maior fabricante indiano de aço, terá 51% do capital da joint venture. O conglomerado será responsável por implantar uma grande fábrica de armas, onde serão produzidos inicialmente fuzis, pistolas e revólveres. Existe uma expectativa do governo indiano de comprar, em cinco anos, meio milhão de fuzis. "A Taurus não investirá quantias em dinheiro propriamente, pois fará o investimento transferindo tecnologia", detalha Nuhs. E, segundo ele, à medida que as licitações ocorrerem, e os equipamentos forem entregues, a joint venture também passará a ter fluxo de caixa para financiar sua futura expansão. Inicialmente, a Taurus enviará kits para montagem das armas. Em seguida, começará a desenvolver fornecedores e mão de obra locais.
Onze meses de negociação
A iniciativa de propor a joint venture partiu, segundo Nuhs, dos indianos – e depois do anúncio do fato relevante e da assinatura do contrato outros países procuraram a Taurus para uma aliança em bases semelhantes. Com o Jindal Group, foram onze meses de negociação – o que surpreendeu positivamente o comando da Taurus. Tratativas do gênero podem se estender por mais de dois anos. "Foi um sucesso pela rapidez. Não foi fácil, pois é uma cultura completamente diferente. Também pelo fato de sermos levados a entender um projeto dessa envergadura e saber o objetivo do governo com ele, pois não existia até então um negócio desse parecido no mundo. Além do mais, a legislação é peculiar também", conta Nuhs que visitou a Índia pessoalmente duas vezes durante o processo de negociação.
A fabricação de armas e munições na Índia é regulada por um sistema de licenciamento estabelecido pela Lei de Indústrias (Desenvolvimento e Regulamentação) de 1951 e pela Lei de Armas de 1959/Regras de Armas de 2016, sob domínio completo do governo. Até 2001, a fabricação de armas de pequeno porte para as forças armadas, paramilitares e policiais estava restrita à produção de empresas pertencentes ao Departamento de Defesa. Em 2001, o governo permitiu a participação de 100% do setor privado indiano na fabricação de armas, sujeita a licenciamento, mas foi só a partir de 2015, através do Arms Act Amendment Bill, que o setor privado começou efetivamente a poder participar da indústria de defesa indiana.
Agora a Taurus se prepara para a segunda fase do negócio – a implantação das linhas de produção, e a busca de fornecedores e colaboradores locais. "Ainda não tenho um parâmetro exato da mão de obra que encontraremos lá, mas certamente não será fácil, pois qualquer produto de defesa exige que seja garantida ao funcionário uma segurança muito grande", antevê Nuhs. No passado, companhias brasileiras que se instalaram na Índia relataram deficiências da força de trabalho local. Com relação ao fornecimento de matéria-prima, o otimismo é total, já que o Jindal Group produz aço. Como forma de conhecer o mercado, funcionários da Taurus estão participando nesta semana de uma feira do setor na Índia. Na ocasião, a nova empresa poderá se apresentar para autoridades e potenciais consumidores.
Resultados valiosos para a Taurus
O mercado indiano poderá dar resultados valiosos para a Taurus. De acordo com relatório divulgado em julho do ano passado pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), a perspectiva de crescimento econômico da Índia para 2020 (7,1%) é superior à da China (5,9%) que deve sofrer um baque no PIB com a recente epidemia do coronavírus. A Índia é o segundo país mais populoso do mundo, com quase 1,4 bilhão de habitantes, e deve ultrapassar a população chinesa na próxima década. Também detém o quarto maior efetivo militar do mundo (1,3 milhão de pessoas), ficando atrás, somente, dos Estados Unidos, da Rússia e da própria China. segundo levantamento da Global Firepower. Seu orçamento de defesa para 2018 foi de US$ 45 bilhões. O país possui 1,4 milhão de policiais e cerca de 7 milhões de agentes de segurança particulares. "O resultado será exponencial para qualquer coisa que se faça na Índia pelo volume que poderemos comercializar", resume o CEO, sem ter, ainda, números precisos.
"A companhia está vivendo o seu melhor momento dos últimos dez, quinze anos", comemora Nuhs. A empresa acumulou lucro líquido de R$ 21,3 milhões até setembro de 2019 – no mesmo período do ano anterior havia apresentado um prejuízo de R$ 44,6 milhões. No Brasil, a Taurus evoluiu tanto sob o critério do volume de vendas (aumento de 15%) como de receita (expansão superior a 16%.) A produção de armas também cresceu mais de 12% em relação ao acumulado até setembro de 2018. Já nos Estados Unidos, a receita de armas apresentou um aumento acima de 21% no acumulado até setembro em comparação com ao mesmo período de 2018, devido aos maiores volumes e à valorização de quase 8% na cotação do dólar médio em relação ao real. E no que depender das estatísticas mais recentes, o país seguirá tendo um peso importante para a fabricante gaúcha.
Até setembro do ano passado, 62% da receita foi proveniente da venda de novos produtos. "Temos um processo de produção robusto. Fabricamos 4 mil armas todos os dias. É um grande volume e, por isso, não abrimos mão de gerenciar o custo", destaca Nuhs que preside a companhia desde 2018. Ele projeta um bom ano para a companhia no Brasil. "Vamos colher os frutos dos decretos assinados pelo presidente. E não vamos tirar vagas de trabalho do Brasil, onde empregamos duas mil pessoas diretamente e outras sete mil indiretamente. A fábrica indiana atenderá aquele mercado e a planta norte-americana aquele país. Não transferiremos a unidade brasileira para lá", ressalta.
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