Brasil, o país que tributa girafas
O Congresso Nacional começa nesta semana a discutir a reforma tributária e pode dar ao Brasil um sistema mais simples e racional de cobrar impostos. Se pairam dúvidas sobre o quanto a estrutura tributária brasileira precisa mudar, o Portal AMANHÃ compila alguns casos bizarros envolvendo tributação no país. Em muitos dos casos relacionados a seguir, empresas, orientadas por seus departamentos jurídicos, mudaram a nomenclatura de seus produtos para reduzir a carga de impostos. Um dos casos mais impressionantes envolve uma companhia sediada na região Sul. Em 2007, a Fundação Hermann Weege, administradora do Zoológico de Pomerode (SC), fez um contrato de permuta com o Aquário de Dallas, nos Estados Unidos. Em troca de 32 aves brasileiras, receberia três girafas, nativas da África do Sul. Quando as girafas chegaram ao Brasil, a Fundação Hermann Weege entendeu que não era necessário pagar PIS (Programa de Integração Social) e Cofins (Contribuição para Financiamento da Seguridade Social).
Esses tributos são ligados ao financiamento de instrumentos sociais, como Previdência, auxílio desemprego e saúde e podem ser cobrados em casos de importação. Mesmo não envolvendo dinheiro na troca entre os zoológicos, o Fisco calculou que a permuta das aves pelas girafas tinha um valor de US$ 63 mil e cobrou US$ 25,3 mil em impostos da Fundação. O caso foi parar no Superior Tribunal de Justiça (STJ). A Fundação argumentou que não se tratavam de mercadorias ou produtos, afastando a possibilidade de incidência de impostos, mas a Corte manteve a cobrança por entender que as girafas se enquadram no conceito de bem, definido pelo Código Civil, para fins de incidência de PIS/PASEP-Importação e Cofins-Importação, para a internalização no território nacional. "São móveis os bens suscetíveis de movimento próprio, ou de remoção por força alheia, sem alteração da substância ou da destinação econômico-social", aponta o artigo 82 da lei. A Fundação chegou a recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF), mas a maior instância judicial do país negou o recurso, mantendo a decisão do STJ..
Desde o início de 2023, o McDonald's não vende mais sorvete. Aquela composição cremosa que sai das máquinas para uma casquinha virou bebida láctea. A mudança de nomenclatura só serve para a Receita Federal. Para o consumidor, a casquinha tem cara de sorvete, textura de sorvete, gosto de sorvete, portanto, é sorvete. Para a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) também continua sendo sorvete, porque, entre outras premissas, passa por rápido congelamento. Não entendeu nada? É assim que o empresário no Brasil se sente quando o assunto é tributo. O McDonald's mudou a nomenclatura na declaração para o Fisco porque a carga tributária global da bebida láctea é de 11,78%, enquanto o sorvete paga, em média, 38,97%, somados todos os tributos. A mudança ocorreu dentro das regras estabelecidas pelo direito tributário. O McDonald's seguiu uma tendência que, de acordo com a Associação Brasileira do Sorvete e Outros Gelados Comésticos (Abrasorvete), tem tomado conta de grandes marcas: os produtos que sempre foram chamados de sorvete expresso ou italiano, agora viraram sobremesa ou massa gelada. Várias situações envolvendo enquadramento de bens para fins tributários tiveram que ser respondidos pela Justiça e pelo Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). São discussões tributárias em torno da classificação fiscal de mercadorias e que podem significar milhões pagos a mais ou a menos em tributos.
Os chocólatras viram a nova embalagem do Sonho de Valsa, mas não ligaram muito. O bombom estava em uma embalagem nova, chamada flow pack, substituindo as emblemáticas duas pontas enroladas. O chocolate continuou o mesmo, então, como diria João Saldanha, vida que segue. Para a Lacta, dona da marca, a diferença é grande. Ao mudar a embalagem, a empresa deixou de classificar o Sonho de Valsa como bombom e passou a classificá-la como wafer, uma combinação de recheio cremoso de amendoim e castanha de caju. No Brasil, bombons pagam 5% de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e os wafers são isentos, pagam nada. A mudança do Sonho de Valsa ocorreu em 2019. Dois anos depois, a marca Garoto também adotou essa estratégia.
Em agosto de 2020, uma empresa importou filmes fotográficos para o Brasil e, no despacho aduaneiro, declarou o bem com a classificação fiscal 3701.10.10, relativa a chapas e filmes para raios X sensibilizados em uma face. Essa classificação paga alíquota reduzida a zero para o IPI. O Fisco não concordou. Para a Receita Federal, a classificação fiscal deveria ser 3701.30.39, relativa a outras chapas sensibilizadas por outros procedimentos, para os filmes cuja dimensão de pelo menos um dos lados fosse superior a 255mm e sensibilizada. Nesse caso, o IPI é de 7,5%. Na contestação junto ao Carf, a importadora precisou apresentar o contrato social,declaração de importação, laudo técnico que baseou o entendimento do auditor fiscal,comunicação da Associação Brasileira da Industria de Material Fotográfico e de Imagem ( ABIMFI), laudo técnico providenciado pela impugnante e extrato do licenciamento de importação do Siscomex. Um mês depois, em 30 de setembro de 2020, o Carf entendeu que a importadora poderia classificar os filmes fotográficos como tinha feito.
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Ao driblar o fisco para pagar menos impostos, as multinacionais reduziram o valor do produto?