Receitas para o país recuperar a confiança dos mercados

A agência de classificação de risco Standard & Poor’sdecidiu, no dia 10 de setembro, rebaixar em um grau a nota de crédito doBrasil, de “BBB-” para “BB+”. Isso significa que a dívida do país está situadaagora em grau de investimento especulativo, tam...
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A agência de classificação de risco Standard & Poor’sdecidiu, no dia 10 de setembro, rebaixar em um grau a nota de crédito doBrasil, de “BBB-” para “BB+”. Isso significa que a dívida do país está situadaagora em grau de investimento especulativo, também conhecido no mercado como“junk”. Além disso, a perspectiva de rating é negativa, o que deixa aberta apossibilidade de que haja novas quedas de qualificação a médio prazo.

A decisão da S&P pressiona as demais agências de risco,Fitch Ratings e Moody’s Investor Services, para que sigam o mesmo caminho. Seisso acontecer, os investidores e os grandes fundos de investimentos, que estãoproibidos de ter em seu portfólio títulos especulativos, poderão se desfazer deUS$ 20 bilhões em títulos da dívida brasileira, de acordo com cálculos daJPMorgan Securities.

Consequências
“A situação pode se complicar ainda mais se as outras duasagências de risco seguirem a decisão da S&P rebaixando igualmente a nota doBrasil”, destaca Valeria Moy, professora de economia do Instituto TecnológicoAutônomo do México. Nesse caso, ela acrescenta que “a saída de capitaiscertamente seria muito mais acentuada, uma vez que os fundos de investimentossó podem aportar recursos em papéis com grau de investimento concedido portodas as agências. Nesse caso, portanto, haveria uma saída importante decapitais que prejudicaria seriamente  aeconomia brasileira”.

“Em geral, o rebaixamento de qualificação de créditodesestimula os fundos de investir no país afetado. Isso gera, claramente, umpanorama ainda mais sombrio do que se observava para o Brasil no tocante àstaxas de crescimento”, assinala Pablo Pincheira, professor da Escola deNegócios da Universidade Adolfo Ibáñez. “Vale lembrar que os prognósticos decrescimento do Brasil têm sido sistematicamente rebaixados”, acrescenta.

A perda do grau de investimento chega em um mau momento, jáque o país está atravessando sua pior situação econômica em 25 anos. O PIBentrou em recessão técnica devido à queda de 1,9% no segundo trimestre do anoem comparação com os três meses anteriores, de acordo com dados divulgados em28 de agosto pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Onúmero foi pior do que a queda de 1,7% prevista pelos 26 economistasconsultados pela agência de notícias Reuters. A economia do país já haviaretrocedido 0,7% entre janeiro e março. A forte queda do preço dasmatérias-primas e a desaceleração da economia chinesa (um dos principaisparceiros comerciais do Brasil) também golpearam fortemente o país.

Para Anita Kon, professora de economia da PontifíciaUniversidade Católica de São Paulo, as consequências do rebaixamento da notabrasileira “se fizeram notar no aumento do custo do financiamento interno eexterno, tanto para o capital circulante quanto para os investimentos, quesofreram cortes tanto no setor público quanto no privado”. Ao mesmo tempo, elaobserva que “espera-se uma maior redução do consumo privado e da produçãoeconômica com o consequente aumento de demissões de trabalhadores e redução de salários”.

Kon diz que era de se prever a saída de capital financeirodo país, extremamente necessário para a realização de novos investimentos, oque elevará as taxas de juros oficiais e provocará a queda dos financiamentosestrangeiros emprestados às empresas brasileiras. Contudo, a história não parapor aí. Kon relata ainda que é provável que haja uma maior desvalorização doreal diante do dólar, elevando os custos de importação dos quais tanto dependeo setor produtivo do país, o que, pressionará, inevitavelmente, o aumento dospreços, os quais já se acham muito acima do objetivo oficial fixado. A inflaçãobrasileira ficou em 9,53% em agosto, de acordo com o IBGE.

Impacto nas empresas
A S&P decidiu rebaixar também a nota de crédito de 31empresas brasileiras, entre elas a Petrobras, Eletrobrás, Itaipu e 13 bancos. Acapacidade de financiamento de algumas das maiores companhias brasileiras seráafetada pela decisão tomada pela agência de classificação de risco. As empresasbrasileiras tomaram emprestados US$ 270 bilhões em títulos da dívidainternacional durante os últimos anos de bonança econômica, de acordo com dadosfornecidos pela Bloomberg. Contudo, é especialmente delicada a situação daPetrobras, que acumula uma dívida de US$ 140 bilhões (a maior de todaspetroleiras mundiais) e se acha sufocada por uma crise de credibilidade devidoaos escândalos de corrupção.

Em um comunicado oficial, a estatal informou que não perderáa capacidade de financiamento de seus projetos a médio prazo, já que seusobjetivos foram alcançados através de capital obtido este ano junto ainstituições financeiras brasileiras e estrangeiras. A empresa enfatizou queseus financiamentos não têm cláusulas vinculadas às notas das agências dequalificação de risco e que, portanto, as últimas decisões tomadas por elas nãoproduzirá mudanças nos contratos existentes. Apesar disso, Kon acredita que apetroleira passará por apuros. “Serão maiores as dificuldades perante oscredores, já que os custos de financiamento serão mais elevados e as condiçõesdos refinanciamentos de seus empréstimos, mais severas”, assegura.

Reação necessária
Felipe Monteiro, professor de estratégia do INSEAD, naFrança, e membro sênior do Instituto Mack para a Gestão da Inovação da EscolaWharton, diz que “o grau especulativo é uma séria advertência, uma grandebandeira vermelha”. E avisa: “A probabilidade de que haja outros rebaixamentosdependerá do que o país faça a partir de agora para enfrentar as questões a eleapresentadas.”

A S&P observou, ao justificar o rebaixamento da notabrasileira, a degradação da situação fiscal do país e colocou em dúvida acapacidade do governo de resolver o problema fazendo alusão aos “crescentesdesafios políticos” pelos quais passa o Brasil em uma clara referência àcorrupção. A agência destacou que a proposta orçamentária para 2016 incorporauma nova revisão dos objetivos fiscais do governo com uma meta de superávitprimário (isto é, antes do pagamento dos juros) de 0,3% do PIB, ante 0,7%anteriormente, refletindo assim “desacordos internos sobre a composição e amagnitude das medidas necessárias”. Além disso, pela primeira vez na história,o Executivo brasileiro apresentou um orçamento deficitário para 2016 de 0,5% doPIB.

Monteiro compara a situação do Brasil com a saúde de umapessoa para explicar o que está acontecendo. “Todo o mundo sabe que precisamosfazer exercícios e comer bem, mas, às vezes, só fazemos isso quando sofremos umataque cardíaco”, explica. “O que aconteceu foi como um infarto para o Brasil,que agora tem de comer bem e fazer exercícios. Se o país continuar negando asituação, as consequências serão muitos mais drásticas do que um ataque docoração: a vida do paciente poderá estar em perigo”, avisa.

De acordo com Monteiro, a presidente Dilma Rousseff devetomar medidas imediatas ao apresentar um novo orçamento que se ocupe dasprincipais preocupações em relação à estabilidade fiscal. “Falou-se deintroduzir novos impostos. Mas, antes disso, é preciso colocar sobre a mesamedidas críveis que reduzam os gastos. O governo deve responder de maneiraoportuna, profissional, transparente e crível”, sugere. De igual modo, Monteiroacha crucial que o Executivo reavalie os programas sociais e considere a possibilidadede fazer cortes.

Kon também acha que, a curto prazo, e como reação imediataao rebaixamento do rating, o governo brasileiro deve buscar o consenso políticopara realizar o ajuste necessário à eliminação do déficit fiscal e alcançar umsuperávit primário maior que permita o pagamento de um custo da dívida quetenderá a aumentar. Para Kon, o ajuste fiscal deve ser feito através de medidasde contenção de gastos, pois o aumento das receitas por meio de impostospressionaria a inflação. Com relação às empresas, Kon afirma que seu objetivodeveria ser o de conter custos, evitar a acumulação de estoques, diminuir amargem de seu negócio e melhorar a inovação para permitir a retomada daprodução a um custo menor.

O grande desafio devoltar a crescer
Kon, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo,acredita que a reativação da atividade econômica e a reindustrialização do paíspara superar a situação atual requerem medidas adicionais a médio e a longoprazos. “Uma política de redução das taxas de juros oficiais; manutenção dataxa de câmbio da moeda em níveis competitivos no comércio exterior e umamelhor integração da produção brasileira à cadeia de valor internacional; umaampla reforma fiscal para reduzir os impostos sobre as arrecadações das empresas;programas de investimento em logística para melhorar os equipamentos dosportos, aeroportos, rodovias e transporte e, por fim, diminuição da burocraciado governo”, enumera.

Pablo Pincheira, professor da Escola de Negócios daUniversidade Adolfo Ibáñez, diz que para sair do poço econômico em que seencontra o Brasil é preciso retomar o quanto antes o caminho do crescimentoeconômico. Isso não será fácil, já que do ponto de vista macroeconômico, o paísse encontra em uma posição na qual ninguém gostaria de estar. “O Brasil está emum cenário recessivo com inflação alta e déficit fiscal elevado. Isso impedeque a política monetária estimule o crescimento porque é preciso estar atentopara que a inflação não prossiga em níveis elevados. De igual modo, é difícilpensar que um gasto fiscal expansivo possa ser uma política sustentável e que,a partir daí, possa se observar uma recuperação do crescimento e doinvestimento. Assim, portanto, o desafio macro mais importante consiste emlevar de volta o déficit fiscal a níveis razoáveis”, explica.

Ele ainda argumenta que a enorme depreciação do real deveriaajudar a estimular as exportações e o turismo, o que abriria um canal capaz decompensar, em parte, o efeito da queda dos preços das matérias-primas.Pincheira compara a situação brasileira com aquela vivida pelo Chile. No últimoano, o real se desvalorizou em cerca de 50%, ao passo que a moeda chilena nãochegou a 30%. Isso significa que o Brasil ganhou competitividade em relação aoChile e a muitos outros países. “Esse mecanismo de ajuste natural deveriaajudar a tomar de volta o caminho do crescimento a médio prazo”, resume.

Valeria Moy, professora de economia do Instituto TecnológicoAutônomo do México, também acha que a “situação da economia brasileira é extremamentecomplexa, não apenas em termos econômicos, mas principalmente políticos”. Elaafirma que a presidente brasileira criou políticas fiscais altamente expansivasque levaram a um aumento significativo do déficit. “Num contexto dedificuldades mundiais, com a menor demanda de matérias-primas da economiachinesa e a perspectiva de um aumento nas taxas de juros pelo Federal Reservedos Estados Unidos, fica muito difícil financiar esse déficit”, adverte.

Valeria lamenta que a crise política dificulte a tomada dedecisões apropriadas que permitiriam contornar a atual situação. Ela achafundamental que o Brasil enxugue o setor público, corte o grande volume degastos ineficiente que tem e faça amplas reformas no mercado de trabalho e emseu sistema fiscal e de aposentadorias. “Tomar tais decisões requer o apoioimportante do Congresso para fazer frente ao repúdio social e popular e, dadosos níveis de aprovação da presidente, é impossível que isso venha a acontecer”,prevê.

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Sexta, 22 Novembro 2024

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