Brasil vs. Alemanha, mas agora em outro campo
O fatídico 7 a 1 para a Alemanha está completando um ano esta semana, mas se você puxar pela memória lembrará que esse não foi o único episódio mal digerido pelos brasileiros à época da Copa do Mundo. Antes de o torneio iniciar, a Adidas colocou à venda, na sua loja virtual, camisetas alusivas à disputa em território nacional – ou, mais especificamente, aos supostos atrativos sexuais das mulheres brasileiras (recorde aqui). A imediata repercussão negativa levou a fabricante alemã a retirar os produtos de circulação (leia mais detalhes aqui), mas não impediu que se questionasse de onde, afinal, vinha o estereótipo que associa o Brasil à sensualidade e a mulheres fáceis. Segundo o pesquisador Michel Nicolau Netto, a construção desse estereótipo é relativamente recente, e remonta à ditadura militar:
“(...) a imagem do Rio de Janeiro associada a “praia, sol e povo alegre” não chega a ter 50 anos. No início do século XX, o Rio era ‘vendido’ como uma Paris brasileira, com ênfase no centro da cidade. Assim, a visão leve e amigável do Brasil foi trabalhada pela Embratur nos anos 1960 e 70 para se contrapor aos prejuízos causados no exterior pela associação do país ao autoritarismo e à violência do regime militar. A própria ideia de liberalidade sexual, movida pelas imagens de mulheres atraentes e escassamente vestidas, hoje abominada globalmente por remeter ao turismo sexual, servia de contraponto e, esperava-se, atenuante à repressão institucional” (Revista Pesquisa Fapesp, janeiro de 2015; matéria completa aqui).
Desde o início da década de 2000, segundo o pesquisador, a Embratur estaria empenhada em reverter essa imagem, não só através do combate ao turismo sexual, como também via tentativa de posicionar o país como ambiente favorável aos negócios e rico em diversidade natural e cultural. Fácil, não é, pois a mesma matéria informa que “agências e governos regionais insistem em manter a imagem mais antiga do Brasil (...)”.
Mesmo que os resultados da estratégia da Embratur sejam incertos, e talvez levem décadas para frutificar, há de se reconhecer o acerto da escolha; não são apenas empresas que competem globalmente, e sim países e continentes inteiros. A concorrência passa, evidentemente, pelos aspectos mais “duros” relacionados ao ambiente de negócios, como infraestrutura, indicadores econômicos e legislação, mas não dispensa o lado soft – comportamento da população, patrimônio natural e manifestações culturais. O Brasil tem o desafio de unir o primeiro conjunto de atributos ao segundo, no qual já possui um histórico bastante razoável, desde que troque, é claro, o registro da sexualidade pelo da diversidade e informalidade típicas locais.
Diferentemente dos alemães, que têm feito questão de ressaltar seu lado leve e afável, na intenção de complementar a fama universal de competência e seriedade da qual desfrutam. E o fizeram, veja só, justamente durante a Copa do Mundo, ocasião na qual sua seleção deu um verdadeiro show de relações públicas. Nos mais de 30 dias em que estiveram em solo brasileiro, os germânicos fizeram de tudo para contrariar a consagrada imagem de casmurros e inflexíveis. Misturaram-se à população local de sua sede, na Bahia, circularam pelas cidades nas quais jogavam, criaram uma camisa rubro-negra alusiva ao Flamengo e, ironia das ironias, chegaram ao ponto de pedir respeito pela seleção brasileira que haviam acabado de humilhar. Ganharam não só o torneio, como também a insuspeita simpatia da população brasileira que, diante de tantas manifestações positivas dos simpáticos visitantes, não teve outra escolha a não ser torcer por eles naquela finalíssima, no Maracanã – muito embora, claro, o fato de a rival ser a Argentina tenha facilitado imensamente a opção nacional...
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