Eu andei errado, eu pisei na bola
Em uma das partidas do Campeonato Brasileiro de 2004, Eduardo Martini, goleiro do Juventude (RS), cometeu um erro grosseiro que redundou na derrota de seu time para o São Paulo. Na saída de campo, o jogador penitenciou-se: "Peço desculpas à torcida. Tive uma atuação ruim e desestruturei a minha equipe".
A manifestação sensibilizou o jornalista Roberto Pompeu de Toledo, que, em sua coluna de VEJA, rendeu homenagens ao arqueiro:
"Qual ministro que diz isso, qual o deputado, qual o diretor do Banco Central, depois dos frangos pantagruélicos que, eles também, costumam engolir? Qual o empresário, o executivo, o jornalista? (...) [C]omportamento raro foi o de Eduardo Martini. Pelo critério da hombridade, herói é ele" (Veja, 04/08/2004).
Hoje, da breve lista de refugadores da própria responsabilidade, Toledo poderia retirar líderes nacionais – ou, ao menos, uma líder nacional específica, Angela Merkel. Semana passada, a chanceler alemã foi aos microfones desculpar-se com seus compatriotas por uma repentina decisão de fechar comércio e indústria locais no período de Páscoa, o que provocou insatisfação e insegurança generalizados, dado o curto período necessário à implantação. "Lamento profundamente e peço desculpas a todos os cidadãos. Eu sou responsável por esse erro", resumiu ela, sem rodeios(leia aqui e também aqui).
Uma manifestação que três pesquisadores provavelmente aplaudiriam. Autores de um artigo sobre o pedido de desculpas pelas organizações, eles recomendam que as escusas venham rapidamente, de um líder sênior, e que sejam condizentes com as expectativas do público – o que, no caso de um país inteiro, encaixar-se-ia na definição de "grande e difuso", e, portanto, digno de uma penitência "'aberta', pela imprensa ou pelas mídias sociais" (Schweitzer, Brooks & Galinsky, Harvard Business Review Brasil, setembro 2015). Tudo o que frau Merkel fez.
É pouco para aplausos? Pelo contrário. Os mesmos autores nos lembram que "somos psicologicamente predispostos a procurar razões (ou escusas) para retardar ou não precisar declarar que sentimos muito", pois "desculpar-se soa desconfortável e arriscado. Envolve perda de poder ou de autoridade". Tudo isso a chanceler teve de relevar para, com a tempestividade devida, manifestar sincero arrependimento.
Em meio a um cenário global tão confuso e imprevisível, Merkel poderia ter tergiversado ou acrescentado uma série de conjunções adversativas ao seu discurso, ou mesmo lembrado que a decisão não fora tomada apenas por ela, e sim em uma reunião com 16 governadores. Mas preferiu ser direta e singela: "Esse erro é somente meu".
Postura bem mais digna do que a de falsos mitos que, embora reiteradamente flagrados em falhas crassas e omissões criminosas, não oferecem qualquer esperança de grandeza semelhante.
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