Cyro Ferreira da Costa

Poucas vezes conheci uma pessoa que tenha transformado tanto o próprio destino quanto ele
Por trás da simplicidade, poucos imaginavam a vontade férrea de quem cresceu determinado a educar os filhos para tocarem os negócios antenado no amanhã

Durante dez anos, tivemos momentos da mais pura alegria. Na vida em comum que eu e Lavínia compartilhamos, meus então sogros eram parte integrante dos festejos e do dia a dia. Primeiro na pessoa de dona Oneida, a criatura mais doce, atenciosa e divertida que se possa imaginar. Sempre ao seu lado, seu Cyro, um homem que eu já admirava antes de privar do convívio próximo. O tempo só fez com que esse sentimento crescesse muitas vezes. Domingo, 26, ele faleceu.

Na varanda do seu apartamento, nossa conversa sempre foi uma fonte valiosa de aprendizado. Nas perguntas que fazia sobre o Brasil e o mundo, havia um viés de perspicácia e experiência que saltava aos olhos. Criador de um império, ele mesmo fixou os paradigmas pelos quais queria que seu grupo empresarial se desenvolvesse. Exposto aos Estados Unidos muito cedo, ainda nos anos 1950, lá vislumbrou o que o Brasil poderia ser mais adiante. Foi uma iluminação.

Muito embora essa dinastia tenha começado em 1884, com a chegada da ferrovia a Garanhuns, foi seu Cyro quem reinventou o destino de uma loja de 300 metros, transformando-a num conglomerado cujos interesses se espraiam por vários estados da Federação, com o toque inconfundível do melhor home center brasileiro o mais bem gerido, o mais bem abastecido, e o mais antenado com as melhores práticas décadas antes do conceito de ESG.

Vi essa expansão acontecer a passo célere e seguro. Ainda assim, vez por outra ele se queixava. "Queria ter chegado a São Paulo, mas não vai dar tempo." Não havia lançamento de livro meu em que ele não estivesse na fila de autógrafos, conversando animadamente com todos os que se aproximavam. Em casa, privamos de muitas sessões de cinema, muitas vezes encarrilhando três filmes de uma sentada só, do almoço até o jantar.

Nas suas festas de aniversário, dançava com dona Oneida e adorava ouvir histórias de contadores. Tinha um sorriso espontâneo e fácil. Por trás da simplicidade, poucos imaginavam a vontade férrea de quem cresceu determinado a educar os filhos para tocarem os negócios antenado no amanhã. Todos tiveram formação exímia, todos trabalharam em grandes empresas e só chegaram à nave-mãe quando estavam à altura do que a missão pedia.

Poucas vezes conheci uma pessoa que tenha transformado tanto o próprio destino quanto ele. Em qualquer lugar do mundo, seria um homem referência de grande valor. Por fim, minha Lavínia perde a pessoa que ela mais admirou na vida. Nos últimos anos, foi incansável na missão de estar ao lado do pai. Tinha dias de sair do Recife cedo, voar para três estados e, à noite, ia à casa dele para contar as novidades que trazia de Salvador, Natal e Aracaju. Estou com ela.

No Porto, conhecemos dois nonagenários que eram o elo remanescente da família em Campanhã. No olhar deles, era imensa a admiração por aquele primo que eles não conheceram, mas que tanto tinha feito para perpetuar o nome deles. No meu coração, sobram saudades e agradecimento por mais esse privilégio que a vida me deu. Sem qualquer dúvida, seu Cyro foi um dos mais visionários homens de negócios do século 20 no Brasil.

Seu imenso legado resistirá.

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Quinta, 21 Novembro 2024

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