O Brasil perante o gigante asiático
O ano de 2015 deve ficar marcado pela concretização de alguns movimentos estratégicos iniciados pela China há quase dez anos. O resultado será poderoso – apesar da crise mundial, dos Estados Unidos e de tudo o mais que se tente fazer para reduzir a marcha chinesa em direção ao pódio mundial. O governo chinês está finalizando seu 13º Plano Quinquenal (2016-2020), no qual projeta novas obras para ampliar e modernizar sua infraestrutura de energia e de transportes. Assim, a China chega a 2015 com a ligação ferroviária entre Yiwu (província de Zhejiang) e a Espanha em funcionamento – em um trajeto de quase 13 mil quilômetros. Vem, ainda, com o início das obras do canal interoceânico na Nicarágua; com tratativas de construção de ferrovias e portos na América do Sul, para permitir o fluxo de mercadorias do Brasil pelo Pacífico; e com obras semelhantes na África. Sempre na lógica de baratear e agilizar o transporte de produtos. Maior exportador e segundo maior importador mundial, a China depende muito disso para manter sua economia crescendo 7% ao ano.
Nesse cenário, o país consolidará sua liderança no setor de energia. Trata-se de um resultado direto dos investimentos feitos em geração eólica e solar, destinados a reduzir a utilização de carvão – que, hoje, responde por dois terços de sua matriz energética. A China também investe em produção de petróleo, na esperança de se livrar da dependência das importações. E consolidará sua liderança mundial – política, econômica e comercial – por obra e graça do maior enfrentamento pacífico com os Estados Unidos: a criação do banco do Brics, junto com Brasil, Rússia, Índia e África do Sul. Um contraponto à hegemonia do dólar norte-americano (e do FMI) sobre a economia mundial que resultará em mudanças significativas a médio e longo prazo – inclusive no comércio internacional.
A “sorte” do restante do mundo é que a China tem fragilidades ambientais (desertos, escassez de água, poluição atmosférica e hídrica) gigantescas. E essas debilidades afetam diretamente a vida, a saúde e a alimentação de sua imensa população. Sorte e também oportunidade: as demandas resultantes dessa situação dramática em produtos e serviços são igualmente gigantescas. Em compensação, suas fortalezas afetam de maneira crescente o setor industrial brasileiro, que optou pelo não enfrentamento com o concorrente mais forte. Ao contrário, o Brasil passou a importar mais e mais produtos manufaturados chineses, seduzido por preços imbatíveis e qualidade cada vez maior. Estudos publicados nos últimos anos pela CNI, IEL, Ipea e outras instituições confirmam esse quadro, tão deprimente quanto preocupante, no que diz respeito ao futuro do setor industrial – e do próprio país. Trata-se da perda de uma riqueza nacional, na medida em que a indústria gera empregos qualificados, divisas e impostos. É também um atraso na geração de ciência, tecnologia e inovação, além de um desestímulo à geração atual de estudantes universitários em dedicar-se a carreiras relacionadas ao setor.
Anima o fato de que o Brasil está “começando de novo” nos governos estaduais e no federal que iniciaram suas gestões há praticamente cinco meses. Isso, talvez, poderá fazer com que saiam do papel as atividades do Plano Decenal assinado em junho de 2012. Tomara que essas iniciativas proporcionem a consolidação, do lado de cá, de uma estratégia do Brasil em relação ao seu maior parceiro comercial. Especialmente no que diz respeito à atração de investimentos e à maior abertura do mercado chinês para os produtos brasileiros.
* Editor da revista em chinês Negócios com o Brasil e colunista do blog Conexão Ásia.
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