A tecnologia decidirá o grau de resiliência do agronegócio
O Conselho Regional de Economia do Rio Grande do Sul (Corecon-RS), com o apoio do Corecon-SC e do Corecon-PR, colocou a lupa sobre o agronegócio da região Sul no cenário pós-pandemia. A entidade convidou Jefrey Kleine Albers, economista e coordenador do Departamento Técnico e Econômico da Federação da Agricultura do Estado do Paraná (Faep); Gláucia Almeida Padrão, economista da Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina (Epagri-SC); e Antônio da Luz, economista-chefe da Federação da Agricultura do RS (Farsul) para o debate. AMANHÃ acompanhou a live e revela, a seguir, as principais discussões travadas pelos especialistas.
O agronegócio foi o único setor a ter saldo positivo no PIB do primeiro trimestre. Enquanto a economia brasileira decresceu 1,5%, o campo avançou 0,6%. "Nesses momentos vemos que vale a pena morar num país que tem a força do agronegócio. O setor é resiliente e também acostumado com volatilidades, afinal, suas fábricas não têm telhado", compara Antônio da Luz. Mas a Covid tem provocado um abalo estrutural tão profundo, que até mesmo o setor vem acumulado cicatrizes – como a ausência de tecnologia em muitas áreas rurais, por exemplo. "A internet não chega em todas as propriedades. No campo, isso representa uma dificuldade, a acessibilidade é um entrave. Temos uma necessidade premente de que se faça um investimento na área", pede Albers.
Nessa esteira está a discussão do acesso à informação, que dificulta a gestão das propriedades. "Gestão é nosso maior problema aqui em Santa Catarina. A permanência do produtor na atividade está muito vinculada a isso. O produtor acaba sendo levado de acordo com o mar, sempre na expectativa de que preço melhore, sem saber que pode reduzir custos e administrar seus serviços de forma mais eficiente", ressalta Gláucia. Segundo Jeffrey, esse é um grande gargalo não apenas no Paraná, mas em todo o Brasil. "Os agricultores precisam entender melhor as dinâmicas do mercado e a tecnologia facilita o acesso às formas de comercialização, além da assistência técnica. Para elevar a produção, é preciso aumentar a produtividade, pois não existe área suficiente para expansão", enfatiza o economista da Faep.
Para o economista da Farsul, a forma como o agronegócio vai lidar com a pandemia apresenta duas alternativas possíveis: passar por essa turbulência exatamente como entrou ou usar a experiência para sair melhor. Segundo Luz, o setor pode ganhar eficiência a partir de agora, reduzindo custos de deslocamento, custos intermediários e de transações, pois será obrigado a colocar a tecnologia na rotina. "As possibilidades já existiam e a pandemia só fez a gente voltar os olhos para elas. As soluções estão aí", alerta. No Paraná, por exemplo, os licenciamentos ambientais serão resolvidos eletronicamente, algo comemorado por Jeffrey que também se tornou um entusiasta das calls via web. "Houve aumento na participação de nossas reuniões on-line, por causa da praticidade e ausência de custos com deslocamentos", conta.
Os impactos de curto e longo prazos
Glaucia acredita que as cadeias voltadas para mercado externo não sofrerão tanto com a crise atual – como aconteceu com a soja, cuja produção já foi, em maior parte, comercializada. "Vejo uma tendência de mudança no padrão de venda dos hortifrutigranjeiros, com o delivery sendo um novo protagonista desse processo. Percebo também que pode haver alteração no tipo de produto consumido. O consumidor valorizará a produção local, de maior qualidade, e os produtos minimamente processados", diagnostica a economista da Epagri. Jefrey vê impactos semelhantes no Paraná. "Acredito que a curva de aprendizagem nas práticas de comunicação permanecerá. Algumas plataformas das cooperativas que permitem comercialização direta, sem intermediadores, devem permanecer", crê. Essa nova dinâmica do mercado pode fazer com que algumas empresas da cadeia agrícola atual não sobrevivam.
Para Antônio da Luz, produtos típicos do mercado interno sofrerão, como é o caso do leite, das frutas e hortifrutigranjeiros. Ele acredita que algumas cadeias devem diminuir sua produção agora. "Tem gente que se ilude e pensa: comer, todo mundo tem de comer. Não é bem assim. Vivemos num país produtor, mas já consumimos bem mais do que o mínimo necessário. Se diminuíssemos o desperdício, já teríamos impactos na demanda. Com restrição forçada pela [perda de] renda, as consequências serão ainda maiores", alerta o economista da Farsul.
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