Sob o olhar de Churchill

Hoje fui fazer uma visita a meu amigo Luiz Felipe D´Avila para saber se ele quer que lhe traga alguma coisa dos Estados Unidos, para onde farei uma curta viagem na semana. Na sala repleta de livros, ele me recebeu com um sorriso e um café, ansioso pa...
Sob o olhar de Churchill

Hoje fui fazer uma visita a meu amigo Luiz Felipe D´Avila para saber se ele quer que lhe traga alguma coisa dos Estados Unidos, para onde farei uma curta viagem na semana. Na sala repleta de livros, ele me recebeu com um sorriso e um café, ansioso para falar sobre a pré-candidatura ao governo de São Paulo, pelo PSDB. No ambiente asseado, enquanto atendia uma chamada, dei uma olhada nas fotos. No porta-retrato maior, a família. No segundo, a esposa Ana Maria, de quem fala sempre com orgulho. Em outra, com o pai e os irmãos. Por fim, bem próxima a ele, a figura inconfundível de Winston Churchill, em preto e banco, apoiado na bengala, divisando a câmera. Sei que em algum lugar da biblioteca deve estar a portentosa biografia do inglês, escrita por William Manchester, livro de cabeceira dele por décadas. Terminado o telefonema, o provoco: "Sempre ao lado de Sir Winston, não é?". Ele assente e olha com carinho a silhueta roliça do ídolo: "Agora mais do que nunca", e explode no sorriso inconfundível. "Churchill é a História viva, posta a serviço da virtude. Ele me inspira nessa nova frente. Foi ele quem disse: ´Quanto mais longe você conseguir olhar para trás, mais longe você verá para a frente`. Acredito nisso".    

Começamos a conversa pelo óbvio, pelo que consta de todos os jornais. Como ele se sente, sabendo que o PSDB nacional passa por uma crise de identidade e está cindido na cúpula. Isso parece não afetá-lo em grande medida. Diz que Alckmin tem capacidade de aglutinação e que não vê como os entreveros possam esvaziar as candidaturas postas. "Tenho viajado direto, a convite das prefeituras. Nada de muito diferente do que sempre fiz à frente do CLP. Mas a perspectiva político-partidária agora é outra, a acolhida é mais entusiasmada. Meu roteiro é Miracatu, Itanhaém, Marília, Jundiaí, Santos, Jaú e assim por diante. O calor da militância faz você renascer, rapaz. Um prefeito como Duarte Nogueira, de Ribeirão Preto, é uma aula magna. Estou feliz e determinado". Toma o café e já puxa um calhamaço para me mostrar: "Estou com ideias para a infraestrutura, a segurança e a educação. Quando você menos esperar, teremos um plano de governo original para apresentar à sociedade". Pergunto se ele não tem medo de ver as expectativas frustradas por Serra ou Doria. Ele sorri e aponta a figura de Churchill: "A coragem é a primeira das qualidades humanas, porque é a qualidade que garante as demais".  

Desligo meu telefone irritante e deixo que ele desenvolva o raciocínio. "Veja bem. Doria sabe que é na prefeitura que um gestor de verdade se prova. Ele não vai perder essa chance. E Serra também sabe que o Senado precisa dele. Se cada um der o melhor de si para o partido, aumentam as chances de levarmos o Geraldo ao Palácio do Planalto. E então, teremos pulado a fogueira do populismo, que é o maior perigo de 2018". Sou obrigado a concordar. Volto à postulação dentro do partido e lembro que dois dos pré-candidatos já desistiam. Não será que ele teme a pressão para ser o próximo? De jeito nenhum, diz. "A tradição do debate interno é saudável e ninguém leva isso tão a sério quanto nós. Mas daí a ser condescendente, vai uma distância. Foi este mesmo Churchill quem disse lá atrás: ´Um apaziguador é alguém que alimenta um crocodilo, esperando ser o último a ser devorado`. Se o partido me chamou, é porque sabe que sou combativo no terreno das ideias. Essa é a diferença". Os telefonemas não param. Vêm de prefeituras do interior para que vá fazer palestras, motivar as bases e autografar o último livro, dos seis que já escreveu. Digo que pode estar vivendo os últimos dias de paz: "Tanto melhor, eu adoro resolver problemas. Nasci para isso".  

Deixo-o trabalhar e me despeço. No fundo, sei que o tempo dele tende a ficar cada vez mais escasso e que dificilmente voltaremos a ter almoços longos. Mas é grande a alegria por ele e pela família que, contrariamente às minhas expectativas, está engajada no projeto. A caminho de casa, é minha vez de pensar em Churchill, depois daqueles minutos de imersão. "Não há delito maior do que a audácia de se destacar", disse ele. Mas tenho certeza de que Luiz Felipe vai se impor pelo jeito, e não pela força. Pela solidez das ideias, não pela estridência do verbo. Pela pauta substantiva, não fulanizada. E imagino que os últimos 30 anos de dedicação à administração pública, culminados em Harvard, o ajudarão a congregar o melhor banco de cérebros do Brasil de todos os tempos. Já em casa, perdido entre as paredes apinhadas de livros, ouvi o telefone que acusava uma mensagem de Whatsapp. Era dele: "Amigo, gostei da visita. Apareça quando regressar. Saiba que estarei pronto a defender a trincheira. E não se deixe impressionar pelos jornais. Sabe o que dizia Churchill, já que falamos tanto dele hoje? ´Política é quase tão excitante quanto a guerra, e quase tão perigosa. Na guerra, você é morto uma vez, mas em política, várias vezes`. Boa viagem e até a volta". 

Fui dormir com a nítida sensação de que presenciara a História em formação no fim da tarde. 

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Quinta, 25 Abril 2024

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